terça-feira, 29 de maio de 2012

100 ANOS DE LUIZ GONZAGA - PARTE II

O barulho do movimento na rua juntava-se o rumor dos bares, da boêmia malandra e constante, soldados e marinheiros do mundo inteiro. Loiros, chinos, brasileiros, alemães, russos, polacos, o diabo.
Desconfiado, Luiz começou a tocar timidamente, mas logo conseguiu companheiro, o guitarrista Xavier Pinheiro, com quem passou a tocar nos bares do Mangue, nas docas do porto, nas ruas, onde houvesse alguém disposto a ouvir e jogar alguns tostões no pires. Acabou sendo convidado para tocar em festinhas de subúrbio e nos cabarés da Lapa, após a meia-noite, quando encerrava seu “expediente” nas ruas da cidade. A sanfona garantia-lhe a sobrevivência e abria-lhe novos caminhos.
No Elite, gafieira da Praça da República, Luiz teria a primeira oportunidade de conhecer uma figura do rádio, o pianista cego Amirton Valin, de tocar seus forrós e chamegos do nordeste.  Era uma exceção, pois seu repertório continuava sendo o exigido pelo público da época: fados, tangos, valsas, foxtrotes, etc..
Foi tocando esses ritmos estrangeiros que Luiz fez as primeiras tentativas no rádio, arriscando-se nos programas de calouros de Silvino Neto e Ari Barroso. Fracasso total: nunca passava de uma medíocre nota 3. Até que um dia um grupo de estudantes cearenses chamou-lhe a atenção para o erro que cometia: por que não apresentava as músicas que crescera ouvindo e tocando, as músicas gostosas dos sanfoneiros do sertão como seu pai Januário e Mestre Duda?
Luiz, dirigindo-se a Ari Barroso, disse:
- boas noite, seu Barroso.
- Rapaz, procure um emprego.
- Seu Ari, me dá licença pra eu tocar um chamego?
- Chamego? O que é isso no rol da coisa mundana?
- O Chamego, seu Barroso, é “musga” pernambucana.
- como é o nome desse negócio?
- Vira e Mexe
- pois arrivira e mexe essa danada.
Luiz virou e mexeu com todo mundo. Ari Barroso deu-lhe nota 5 e o prêmio de 15$000. O público pediu bis, entusiasmado com a descoberta. Luiz também fazia uma descoberta:
- havia ambiente para as músicas do nosso sertão, havia um filão a explorar, até então virgem, pois não passavam de contrafrações grosseiras aqueles programas sertanejos com emboladas e rancheiras.
Não deixou o pires do Mangue, mas começou a aparecer em programas de rádio, como o de Zé do Norte, e a conhecer os compositores que admirava: Augusto Calheiros, Antenógenes Silva.
Este último, ao saber que Gonzaga tocava no Mangue, profetizou:
- pois vá se aguentando lá, que seu dia chegará.
E o dia começou a chegar quando Luiz, tocando no Mangue, foi procurado por Januário França, que precisa de um sanfoneiro para acompanhar Genésio Arruda numa gravação. Luiz hesitou:
- Será que eu acerto?
- é sopa, rapaz.
Luiz saiu-se tão bem no acompanhamento que o diretor artístico da RCA, Ernesto Matos, pediu-lhe para tocar alguma coisa em solo. Luiz tocou duas valsas e uma rancheira. Matos gostou e acabou fazendo uma concessão:
- agora meta lá esse negocinho do norte que você disse que tem.
O “negocinho”: o chamego Vira e Mexe e o xótis No meu pé de Serra.
- amanhã pode vir gravar – 14 de março de 1941, Luiz Gonzaga gravou seus dois primeiros discos como solista da sanfona. No primeiro, a mazurca Véspera de São João (Luiz Gonzaga- Francisco Reis) e a valsa Numa Serenata (Luiz Gonzaga). No segundo: a valsa Saudades de São João del Rei (Simão Jandi) e Vira e Mexe (Luis Gonzaga).
“ Um dia, chegado do Recife, meu irmão ouviu meu Vira e Mexe. Ele gostou e disse: “Mano, isto é chamego...!”. chamego quer dizer um abraço bem apertado, bem amoroso. Assim nasceu o chamego.
Os três 78 rotações que viriam a seguir manteriam a mesma proporção de música nordestina: Nós queremos uma valsa (Nássara e Frazão), Farolito (Agustín Lara)  e só então o Pé de Serra.
Durante cinco anos Luiz Gonzaga gravaria cerca de setenta músicas, das quais apenas 10 seriam chamegos. A maior parte eram valsas, polcas, mazurcas e chorinhos, quase sempre de autoria do próprio Luiz Gonzaga.
Durante cinco anos Luiz Gonzaga faria carreira no rádio carioca. Começou com um contrato na Rádio Clube, para onde o levou Renato Murce. Tocava no teatro com Genésio Arruda e nas noites de domingo, animava os dancings do centro da cidade. Deixara de vez o Mangue e a dupla com Xavier Pinheiro. Mas não esqueceu o amigo que inclusive o abrigara em sua casa; gravou algumas músicas de Xavier, divulgando-as para além dos bares frequentados por marinheiros e prostitutas.
Bom dinheiro, título de “maior sanfoneiro do nordeste” não satisfaziam Luiz. As valsas, polcas, tangos  lhe pareceram solos desenxabidos, inautênticos. Desejava fugir do ramerrão, das valsas rancheiras. Fizera outras experiências fora do rádio, e os resultados eram animadores: aplaudiam-no tocando choros, chamegos, forrós e calangos. Luiz começava a sua luta para tocar, cantar e gravar suas músicas nordestinas. Contratado pela Rádio Nacional, Paulo Gracindo, olhando para o rosto redondo de Luiz, apelidou-o de “Luiz Lua Gonzaga”.
Luiz conhece Miguel Lima que passou a colocar letra em suas músicas e entusiasmava Luiz a gravá-las. Mas a RCA não lhe dava permissão para cantar. Luiz armou um estratagema: anunciou que fora convidado para, usando um pseudônimo, gravar cantando na Odeon.
Vitório Lattari, diretor artístico da RCA, cedeu diante da ameaça e saiu Dança Mariquinha, mazurca de Luiz e Miguel Lima.
Ao receber o dinheiro das gravações Luiz descobriu que o cantor vendia mais do que o sanfoneiro. Em 1945, ainda em parceria com Miguel Lima, lançou dois grandes sucessos: Penerô Xerém e Cortando o Pano
Apesar de ótimo compositor e de bom companheiro, Miguel Lima não dava valor àquelas ideias de Luiz em querer cantar músicas do norte, de ritmo ainda desconhecido no restante do Brasil. Luiz resolveu então procurar um parceiro nordestino. Procurou Lauro Maia, mas esse, com muita modéstia não quis tomar parte na iniciativa proposta por Luiz, mas indicou-lhe um cunhado para ajudá-lo: Humberto Teixeira.
Cearense de Iguatu, nascido aos 5 de Janeiro de 1915, onde estudou as primeiras letras e aprendeu bandolim e flauta, Humberto Teixeira fez o curso secundário em Fortaleza. Naquela época atuou como flautista-aluno durante algum tempo na Orquestra Iracema, dirigida pelo maestro Antonio Moreira.
Em 1934, dois anos após a sua chegada ao Rio de Janeiro, foi um dos vencedores do concurso de músicas carnavalescas promovido pela revista “O Malho”. Sua música, Meu pedacinho, classificou-se ao lado das de Ari Barroso, Cândido das Neves, José Maria de Abreu e Ari Kerner. Mas essa vitória não foi suficiente para que Humberto alcançasse gravação. Seu primeiro êxito em gravação foi Sinfonia do Café, feita especialmente para Muiraquitã, espetáculo encenado no Teatro Municipal.
Recém-formado pela Faculdade Nacional de Direito, Humberto ensaiava, paralelamente às atividades musicais, os primeiros passos de advogado, num escritório da Avenida Calógeras. E foi lá,  numa tarde de agosto de 1945, que recebeu o moreno simpático, de cabeça chata e sorriso rasgado, buscando um parceiro para a empreitada de lançar no Rio de Janeiro a autêntica “música do norte”.
Do longo bate-papo que se prolongou noite adentro, surgiram os primeiros compassos de Pé de Serra e a “sanfonização” de uma linda peça que viria a se transformar na imortal Asa-Branca. O mais importante daquele encontro, porém, foi o comum acordo a que chegaram a respeito do baião: entre os inúmeros ritmos nordestinos, aquele era o mais “estilizável” e “urbanizável”. O mais apropriado, portanto, em suas características e tipicidade, para lançamento da campanha musical que os dois resolveram deflagrar a partir daquele momento.
Assim nasceu o Baião (“eu vou mostrar pra vocês como se dança um baião...”) primeiro desse gênero gravado em todo o mundo. Numa batida uniforme do princípio ao fim, o baião de Humberto e Luiz substituía os instrumentos originais (viola, pandeiro, botijão e rabeca) pelo acordeão, triângulo e zabumba. Resultado: uma melodia singela, de sabor gregoriano, com versos simples e impregnados de modismos tipicamente nordestinos.
Foi uma revolução. A música popular brasileira, que então oscilava entre o samba-canção e os ritmos importados, foi surpreendida por algo completamente novo e gostoso –o baião – que deu uma sacudida em quatro séculos de nossa música.
Os êxitos da dupla se sucederam: MANGARATIBA, JUAZEIRO, PARAÍBA, QUI NEM JILÓ, XANDUZINHA, BAIÃO DE DOIS e muitos outros. Em toda parte só se ouvia o baião e compositores do sul como Hervê Cordovil e Waldir Azevedo, logo aderiram. Mas em 1950 a parceria se desfez: Luiz deixou a UBC e foi para a SBACEM. Humberto elegia-se deputado federal, passando a lutar pelo direito autoral e fazendo aprovar pelo Congresso a Lei Humberto Teixeira, possibilitando as excursões das célebres “caravanas” musicais por todo o mundo.
Humberto Teixeira divide com Luiz Gonzaga a glória do lançamento do baião.  Eleito em 1950, 1951 e 1952 “o melhor compositor nacional”, pela Revista do Rádio”, foi recebido pelo então Presidente Getúlio Vargas. Em 1956 com o compositor João de Barro fundou a Academia Brasileira de Música Popular.
Em 1949, em sua segunda viagem ao Recife, Luiz Gonzaga foi abordado por um estudante de medicina que sabia todas as suas músicas e conhecia muito bem os costumes do sertão. Além disso, cantarolou algumas composições suas que deixaram Luiz “arrepiado”. Este estudante era José de Souza Dantas filho, o Zé Dantas.
Luiz resolveu na mesma hora gravar as coisas de Zé Dantas. O moço só fez uma exigência: que seu nome não aparecesse, pois sua família não iria gostar. Luiz não atendeu ao pedido do novo amigo, que em 1950 vinha para o Rio de Janeiro fazer  estágio em obstetrícia, logo tornando-se médio efetivo.  A família também não ficou zangada, pois sabia que Zé Dantas continuava um moço sério.
Foi na mesma época em que gravava suas últimas composições com Humberto Teixeira que Luiz lançou Zé Dantas: Vem Morena (outubro de 1949), A dança da moda (abril de 1950), Cintura fina (maio de 1950), A volta da Asa-branca (agosto de 1950). Com o novo parceiro faria música brejeiras, como o Xótis das Meninas, mas principalmente, reafirmando sua intenção de cantar o nordeste em seus aspectos curiosos: ABC do Sertão, Vozes da Seca, Algodão, Paulo Afonso, músicas voltadas para os problemas sociais do nordeste e do país, hoje são encaradas como precursoras da chamada “música de protesto”. Um “protesto lírico”, nas palavras de Luiz Gonzaga.
Essa música revela tendências pioneiras do cancioneiro popular, no sentido do “protesto social”. Feita na época que uma grave seca assolava o nordeste, criticava as campanhas do sul angariando ajuda em gêneros alimentícios, roupas, etc... enquanto se desenvolvia uma “indústria da seca”, com muita gente enriquecendo graças aos desvios de verbas e nada se fazia para resolver o problema.

VOZES DA SECA
Seu douto os nordestino
Têm muita gratidão
Pelo auxílio dos sulista
Nessa seca do sertão
Mais douto uma esmola
A um home qui é são
Ou lhe mata de vergonha
Ou vicia o cidadão.

É por isso que pidimo
Proteção a vosmicê
Home pur nóis escuído
Para as rédias do pudê
Pois douto dos vinte estado
Temos oito sem chuvê
Veja bem, quase a metade
Do Brasil tá sem cume

Dê serviço a nosso povo
Encha os rio de barrage
Dê cumida a preço bom
Não esqueça a açudage
Livre assim nóis da ismola
Que no fim dessa estiage
Lhe pagamo até os juru
Sem gastar nossa corage

Se o douto fizer assim
Salva o povo do sertão
Se um dia a chuva vim
Que riqueza pra nação
Nunca mais nóis pensa em seca
Vai dá tudo nesse chão
Cúmu vê, nosso distino
Mecê tem na vossa mão.

A parceria com Zé Dantas terminaria com a morte prematura do médico pernambucano em 1962 aos 41 anos. Morria numa época em que o baião e a música sertaneja não mais dominavam as grandes cidades, permanecendo vivos, entretanto, no interior do país.
Compositor, sanfoneiro, cantor famoso, Luiz não tinha quem cuidasse de suas roupas e lhe fizesse o jantar. Remediava a situação morando com a família de seu irmão Zé, que também fazia carreira na música popular.  Mas queria mesmo casar, ter uma família e sua vida sossegada. Namorou algumas colegas de rádio e em 1948 casou-se com a pernambucana Helena das Neves, contadora de um laboratório do Rio de Janeiro. O casal teve dois filhos Rosinha e Luiz Gonzaga Jr.
Segundo a Enciclopédia Wikipédia, Rosinha e Luiz Gonzaga Jr. eram filhos adotivos do casal, uma vez que Helena não podia engravidar.
Em 1945 uma cantora de coro chamada Odaléia Guedes dos Santos deu à luz um menino, no Rio. Luiz Gonzaga mantinha um caso há meses com a moça - iniciado quando ela já estava grávida. Luiz, sabendo que sua amante ia ser mãe solteira, assumiu a paternidade da criança, adotando-o e dando-lhe seu nome: Luiz Gonzaga do Nascimento Júnior. Odaléia, que além de cantora de coro era sambista, foi expulsa de casa por ter engravidado do namorado, que não assumiu a criança. Ela foi parar nas ruas, sofrendo muito, até que foi ajudada e descobriu-se seu talento para cantar e dançar, e ela passou a se apresentar em casas de samba no Rio, quando conheceu Luiz.  A relação de Odaléia, conhecida por Léia, e Luiz, era bastante agitada, cheia de brigas e discussões, e ao mesmo tempo muita atração física e paixão. Após o nascimento do menino, as brigas pioraram, já que havia muito ciúmes entre os dois. Eles resolveram se separar com menos de 2 anos de convivência. Léia ficou criando o filho, e Luiz,às vezes, ia visitá-los.
Em 1948 Léia morreu de tuberculose, para desespero de Luiz. O filho deles, apelidado de Gonzaguinha, ficou órfão com 2 anos e meio. Luiz queria levar o menino para morar com ele e Helena, e pediu para a mulher criá-lo como se fosse dela, mas Helena não aceitou, juntamente com sua mãe, Marieta, que achava aquilo um absurdo, já que nem filho verdadeiro de Luiz era. Luiz não viu saída: Entregou o filho para os padrinhhos da criança, Leopoldina e Henrique Xavier Pinheiro, criá-lo, no Morro do São Carlos. Luiz sempre visitava a criança e o menino era sustentado com a assistência financeira do artista. Luizinho foi criado como muito amor. Xavier o considerava filho de verdade, e lhe ensinava viola, e o menino teve em Dina um amor verdadeiro de mãe.

Fonte: Nova História da Música Popular Brasileira
Abril Cultural - 2ª Edição-  1977



quarta-feira, 2 de maio de 2012

100 ANOS DE LUIZ GONZAGA - PARTE III

O BAIÃO E SUA ORIGEM



Eu vou mostrá pra vocês
como se dança um baião
e quem quiser aprender
é favor prestar atenção
morena chega pra cá
bem junto ao meu coração
agora é só me seguir
pois eu vou dançar o baião

eu já dancei balanceio
chamego, samba e xerém
mais o baião tem um quê
que as outras danças não têm
quem quiser é só dizer
pois eu com satisfação
vou dançar cantando o baião

eu já dancei no Pará
toquei sanfona em Belém
cantei lá no Ceará
e sei o que me convém
Por isso eu quero afirmá
com toda convicção
que sou loco pelo baião


Um casal dança no meio da assistência fazendo uso de palmas, sapateados, castanholas e estala os dedos com os braços abertos. Em seguida, dirige-se a outro casal e aplica-lhe uma umbigada. É sinal de que este novo par deve substituí-lo no centro da roda, demonstrando sua habilidade nos pés e velocidade nos movimentos do corpo.
Isto é, o baião ou baiano (por ser característico dos Estados Nordestinos, da Bahia para cima), dança mestiça, de origem africana, transformada quase numa dança típica do interior de Pernambuco.
Depois dos improvisos dos dançarinos, começa o desafio poético entre os participantes. Afirma o folclorista Luis da Câmara Cascudo que os cantadores sertanejos chama de baião ou rojão a breve introdução musical executada antes do desafio.
Em sua forma original, os instrumentos empregados na execução do baião foram a viola, o pandeiro e a rabeca. Com a urbanização e estilização realizadas por Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira o ritmo nordestino chegou até mesmo às grandes orquestras.
Para o maestro Júlio Medaglia há um aspecto muito curioso no baião: sua utilização de modos medievais ao lado do sistema tonal, comum a quase toda a música popular urbana ocidental. O sistema tonal resume-se, primitivamente, num encadeamento básico de acordes que o acompanhador executa de acordo com as exigências da melodia, os quais caracterizam o tom no qual a música se baseia – os famosos dó maior, si menor, mi bemol maior, etc.
O sistema acústico modal (de origem grega)  é anterior ao tonal e era comum na Idade Média. Possui um encadeamento melódico diferente que pode ser observado no canto gregoriano. Os modos baseavam-se numa série de escalas (espécie de tons da nossa época), cada uma com características diferentes e com nomes próprios.
O baião Juazeiro, por exemplo, é baseado no modo medieval mixolídio. Ele assemelha-se a uma escala tonal de dó maior, mas com si bemol, isto é, com a sétima nota da escala abaixada. 
“Juazeiro velho amigo”: a sílaba “vê” é cantada no sétimo grau da escala, abaixado.
É difícil identificar na colonização brasileira qual é exatamente o fenômeno que originou o uso de modos medievais na composição popular. Provavelmente é uma consequência da catequese dos padres carmelitas e franciscanos, assim como o contato com os beneditinos, que se espalharam pelo norte do Brasil e eram os principais praticantes do canto medieval codificado por são Gregório.
Luiz, na época do baião (1948-1954) instalou seu quartel-general em São Paulo, onde era obrigado a cantar sobre marquises de edifícios ou instalar alto-falantes na rua, pois os auditórios não comportavam o público que queria ouvi-lo. De São Paulo viajava para todo o Brasil
A fase de grande sucesso do baião nas cidades do sul prolongou-se até meados dos anos 50. Nessa época, as mudanças ocorridas na música popular brasileira, levando ao público novos padrões, contribuíram para o declínio do baião e do êxito de Luiz Gonzaga nas grandes paradas.  Mas ele ainda era ouvido e muito nas pequenas cidades do interior, principalmente no nordeste.
As novas gerações dos grandes centros, contudo, poucos sabiam sobre o trabalho musical realizado por Luiz Gonzaga. O ostracismo a que foi condenado por boa parte da indústria cultural pode ser avaliado por um episódio ocorrido num momento em que a música jovem era a grande fonte de lucros da televisão e do rádio:
- Uma vez eu procurei um disc-jockey conhecido, e pedi pra ele tocar uma música minha no seu programa. E sabe o que ele me respondeu?
-Gonzaga, você tem que compreender que agora é a juventude, você já era, isso já passou; me desculpe a franqueza”.
- Aí, eu botei minha viola no saco e fui me esconder no meu pé de serra, pensando mesmo que já tinha acabado.
No entanto, foi a própria juventude a principal responsável pelo retorno e pela revalorização de Luiz Gonzaga, pelo reconhecimento de sua expressiva contribuição à música popular brasileira.
Tudo começou quando Carlos Imperial- que já apontara a semelhança da música dos Beatles com a música nordestina – lançou o boato de que o conjunto inglês ia gravar Asa Branca. A notícia estourou como uma bomba e, graças a isso, o Rei do Baião voltou a ser discutido e convidado a participar de programas de televisão.
Essa redescoberta do velho Lua assumiu maior significado quando os novos compositores brasileiros da década de 60, principalmente os tropicalistas, afirmaram haver encontrado em sua música uma das fontes de inspiração.
- eu nem conhecia Gilberto Gil, Caetano, e não conhecia a moçada – lembra Luiz Gonzaga. – De repente, começaram a dizer que eu era o
“pai da criança”.
A identificação de Luiz Gonzaga com os jovens compositores concretizou-se pela primeira vez num LP em que ele cantava músicas de Edu Lobo, Caetano, Gil, Vandré, Capinam. O disco significou para ele uma experiência nova e uma homenagem aos meninos – isso num momento político em que muitos dos homenageados estavam preferindo ou precisando deixar o país.
O reencontro de Luiz Gonzaga com a plateia urbana, contudo, já estava evidenciado.  Nesse sentido teve papel decisivo seu show realizado em março de 72, no Teatro Teresa Raquel. Os laços com o novo público  estreitaram-se também pelo grande número de shows universitário. É por essa época que ele volta às paradas de sucesso com Ovo de Codorna, uma “receita de afrodisíaco” de autoria do compositor nordestino Severino Ramos. Essa nova fase da carreira do Rei do Baião culmina com regravações de Asa Branca, por Caetano Veloso e, depois, Luiz Gonzaga Jr. Ambos recriaram a antiga composição, conferindo-lhe um caráter original.
Apesar do repetido sucesso de Asa Branca, essa não era a música preferida de Gonzaga. A maior parte de seu carinho volta-se para A Triste Partida, canção de autoria de Patativa de Assaré que descreve a longa e árdua jornada de um nordestino em direção à cidade grande. Gonzaga a considerava “ o assunto mais sério que já gravei”.
Luiz Gonzaga sempre foi apegado às coisas de seu “pé de serra”.Não perdia nenhuma oportunidade de visitar Exu, para rever os amigos e o velho pai.
Com 35 anos de vida profissional, e com cerca de oitocentas músicas gravadas, Luiz Gonzaga começou a instalar em Exu, o “Museu Luiz Gonzaga, contando com a assessoria de sua mulher, Helena. Roupas de apresentações, instrumentos musicais, partituras – enfim, tudo o que se refere à longa carreira artística de Luiz Gonzaga.
- Nada mais justo do que instalar o museu na minha terra, disse Luiz Gonzaga. Na verdade, eu nunca saí de lá, sempre estive ligado sentimentalmente ao meu pé de serra.
Luiz Gonzaga era Maçon e é o compositor, juntamente com Orlando Silveira, da música "Acácia Amarela". Luiz Gonzaga foi iniciado na Loja Paranapuan, Ilha do Governador em 03/04/1971.  
Luiz Gonzaga sofria de osteoporose há alguns anos. Morreu vítima de parada cardiorrespiratória no Hospital Santa Joana, em Recife, no dia 2 de agosto de 1989.



COMPOSIÇÕES E GRAVAÇÕES DE LUIZ GONZAGA

  • A dança da moda, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1950)
  • A feira de Caruaru, Onildo Almeida (1957)
  • A letra I, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1953)
  • A morte do vaqueiro, Luiz Gonzaga e Nelson Barbalho (1963)
  • A triste partida, Patativa do Assaré (1964)
  • A vida do viajante, Hervé Cordovil e Luiz Gonzaga (1953)
  • Acauã, Zé Dantas (1952)
  • Adeus, Iracema, Zé Dantas (1962)
  • Á-bê-cê do sertão, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1953)
  • Adeus, Pernambuco, Hervé Cordovil e Manezinho Araújo (1952)
  • Algodão, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1953)
  • Amanhã eu vou, Beduíno e Luiz Gonzaga (1951)
  • Amor da minha vida, Benil Santos e Raul Sampaio (1960)
  • Asa-branca, Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga (1947)
  • Assum-preto, Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga (1950)
  • Ave-maria sertaneja, Júlio Ricardo e O. de Oliveira (1964)
  • Baião, Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga (1946)
  • Baião da Penha, David Nasser e Guio de Morais (1951)
  • Beata Mocinha, Manezinho Araújo e Zé Renato (1952)
  • Boi bumbá, Gonzaguinha e Luiz Gonzaga (1965)
  • Boiadeiro, Armando Cavalcanti e Klécius Caldas (1950)
  • Cacimba Nova, José Marcolino e Luiz Gonzaga (1964)
  • Calango da lacraia, Jeová Portela e Luiz Gonzaga (1946)
  • O Cheiro de Carolina, - Sua Sanfona e Sua Simpatia - Amorim Roxo e Zé Gonzaga (1998)
  • Chofer de praça, Evaldo Ruy e Fernando Lobo (1950)
  • Cigarro de paia, Armando Cavalcanti e Klécius Caldas (1951)
  • Cintura fina, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1950)
  • Cortando pano, Jeová Portela, Luiz Gonzaga e Miguel Lima (1945)
  • De Fiá Pavi (João Silva/Oseinha) (1987)
  • Dezessete légua e meia, Carlos Barroso e Humberto Teixeira (1950)
  • Feira de gado, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1954)
  • Firim, firim, firim, Alcebíades Nogueira e Luiz Gonzaga (1948)
  • Fogo sem fuzil, José Marcolino e Luiz Gonzaga (1965)
  • Fole gemedor, Luiz Gonzaga (1964)
  • Forró de Mané Vito, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1950)
  • Forró de Zé Antão, Zé Dantas (1962)
  • Forró de Zé do Baile, Severino Ramos (1964)
  • Forró de Zé Tatu, Jorge de Castro e Zé Ramos (1955)
  • Forró no escuro, Luiz Gonzaga (1957)
  • Fuga da África, Luiz Gonzaga (1944)
  • Hora do adeus, Luiz Queiroga e Onildo Almeida (1967)
  • Imbalança, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1952)
  • Jardim da saudade, Alcides Gonçalves e Lupicínio Rodrigues (1952)
  • Juca, Lupicínio Rodrigues (1952)
  • Lascando o cano, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1954)
  • Légua tirana, Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga (1949)
  • Lembrança de primavera, Gonzaguinha (1964)
  • Liforme instravagante, Raimundo Granjeiro (1963)
  • Lorota boa, Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga (1949)
  • Moda da mula preta, Raul Torres (1948)
  • Moreninha tentação, Sylvio Moacyr de Araújo e Luiz Gonzaga (1953)
  • No Ceará não tem disso, não, Guio de Morais (1950)
  • No meu pé de serra, Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga (1947)
  • Noites brasileiras, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1954)
  • Numa sala de reboco, José Marcolino e Luiz Gonzaga (1964)
  • O maior tocador, Luiz Guimarães (1965)
  • O xote das meninas, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1953)
  • Ô véio macho, Rosil Cavalcanti (1962)
  • Obrigado, João Paulo, Luiz Gonzaga e Padre Gothardo (1981)
  • O fole roncou, Luiz Gonzaga e Nelson Valença (1973)
  • Óia eu aqui de novo, Antônio Barros (1967)
  • Olha pro céu, Luiz Gonzaga e Peterpan (1951)
  • Ou casa, ou morre, Elias Soares (1967)
  • Ovo azul, Miguel Lima e Paraguaçu (1946)
  • Padroeira do Brasil, Luiz Gonzaga e Raimundo Granjeiro (1955)
  • Pão-duro, Assis Valente e Luiz Gonzaga (1946)
  • Pássaro carão, José Marcolino e Luiz Gonzaga (1962)
  • Pau-de-arara, Guio de Morais e Luiz Gonzaga (1952)
  • Paulo Afonso, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1955)
  • Pé de serra, Luiz Gonzaga (1942)
  • Penerô xerém, Luiz Gonzaga e Miguel Lima (1945)
  • Perpétua, Luiz Gonzaga e Miguel Lima (1946)
  • Piauí, Sylvio Moacyr de Araújo (1952)
  • Piriri, Albuquerque e João Silva (1965)
  • Quase maluco, Luiz Gonzaga e Victor Simon (1950)
  • Quer ir mais eu?, Luiz Gonzaga e Miguel Lima (1947)
  • Quero chá, José Marcolino e Luiz Gonzaga (1965)
  • Padre sertanejo, Helena Gonzaga e Pantaleão (1964)
  • Respeita Januário, Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga (1950)
  • Retrato de Um Forró,Luiz Ramalho e Luiz Gonzaga (1974)
  • Riacho do Navio, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1955)
  • Sabiá, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1951)
  • Sanfona do povo, Luiz Gonzaga e Luiz Guimarães (1964)
  • Sanfoneiro Zé Tatu, Onildo Almeida (1962)
  • São-joão na roça, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1952)
  • Siri jogando bola, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1956)
  • Tropeiros da Borborema, Raimundo Asfora / Rosil Cavalcante
  • Vem, morena, Luiz Gonzaga e Zé Dantas (1950)
  • Vira-e-mexe, Luiz Gonzaga (1941)
  • Xanduzinha, Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga (1950)
  • Xote dos cabeludos, José Clementino e Luiz Gonzaga (1967)


Fonte:Nova História da Música Popular Brasileira
Abril Cultural -2ª edição -1977
Google - Enciclopédia Wikipédia


 QUI NEM JILÓ - LUIZ GONZAGA- HUMBERTO TEIXEIRA



IMBALANÇA - LUIZ GONZAGA- ZÉ DANTAS

FONTE: youtube