quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

WALDEMAR HENRIQUE - I - LENDAS AMAZÔNICAS



No final do século XIX, a extração de borracha começou a se expandir na Amazônia devido à grande procura internacional. O Brasil tornou-se o maior produtor do mundo, e Manaus uma das cidades mais ricas do país.  Belém, situada na desembocadura do rio Amazonas, teve grande desenvolvimento. Entre 1868 e 1872 sua população aumentou de 30 mil para 62 mil habitantes, e em 1920 a população já era de 236 mil habitantes.  Mas a hegemonia brasileira no fornecimento da borracha começou a se enfraquecer quando os ingleses fizeram extensas plantações no Oriente.  Por volta de 1914, a produção brasileira restringia-se à metade da demanda mundial. No final da década de 30, o Brasil contribuía com apenas 3 %. Retrata Vicente Salles em Música e Músicos do Pará:  “desenvolveu-se então uma arte e literatura regionais bem definidas. Afirmou-se o teatro popular , talvez o mais típico produto cultural dessa sociedade arruinada economicamente antes de haver amadurecido suas potencialidades criadoras”.  Nesse período sombrio surgiram compositores que sobressaíram como criadores de canções. É a geração de WALDEMAR HENRIQUE, GENTIL PUGET, NAYME OVALLE, IBERÊ LEMOS, MÁRIO NEVES, SÁTIRO DE MELO. 

O UIRAPURU

As onze canções que formam a série LENDAS AMAZÔNICAS de Waldemar Henrique constituem expressivo exemplo da força telúrica da região.  As melodias muito simples mas extremamente expressivas, mais próximas da fala do que do canto, apoiam-se numa escrita pianística geralmente imitativa e rítmica, e possuem  impressionante intensidade lírica. Sete delas foram editadas: FOI BOTO, SINHÁ! COBRA GRANDE, TAMBATAJÁ, MATINTAPERERA, UIRAPURU, CURUPIRA E MANHA-NUNGARA.
FOI BOTO SINHÁ e MATINTAPERERA têm versos de Antônio Tavernard; as palavras das demais são de Waldemar Henrique. NAYÁ, JAPIYM, PAHY-TUNA e UIARA conservam-se em manuscrito.

 
  NAYÁ  
        RECITAL DE MESTRADO DE ISABELA DE FIGUEIREDO SANTOS - 2009 -UFMG


FOI BOTO SINHÁ! (às vezes chamada de TAJAPANEMA, em virtude de seu verso inicial),   TAMBATAJÁ e UIRAPURU tornaram-se conhecidas por milhares de brasileiros, a partir do movimento em torno do canto orfeônico que transformou a maior parte das canções de Waldemar Henrique em arranjos corais largamente difundidos.





      RECITAL DE MESTRADO DE ISABELA DE FIGUEIREDO SANTOS - 2009 - UFMG
             
FOI BOTO, SINHÁ!
 Tajá-panema chorou no terreiro
Tajá-panema chorou no terreiro
E a virgem morena fugiu pro costeiro
Foi boto, sinhá
Foi boto, sinhô
Que veio tentá
E a moça levou
No  tal dançará
Aquele doutô 

Foi boto, sinhá
 Foi boto, sinhô
Tajá-panema se pôs a chorar
Tajá-panema se pôs a chorar
Quem tem filha moça é bom vigiá!
Tajá-panema se pôs a chorar
Tajá-panema se pôs a chorar
Quem tem filha moça é bom vigiá!
O boto não dorme
No fundo do rio
Seu dom é enorme
Quem quer que o viu
Que diga, que informe
Se lhe resistiu
O boto não dorme
   No fundo do rio...

A 15 de fevereiro de 1905, em Belém do Pará,  nasceu Waldemar Henrique da Costa Pereira. No ano seguinte morreu sua mãe Dona Joana da Costa Pereira. O pai, Thiago Joaquim Pereira, pouco depois levou a família para o seu país de origem e, em 1911, na cidade portuguesa do Porto, Waldemar iniciou o curso primário. Voltando a Belém em 1917, continuou seus estudos no Colégio Pará e Amazonas.
Waldemar gostava de música desde menino e, aos treze anos, começou um curso de piano. O pai não consentiu, e dispensou a professora; o rapaz passou a estudar clandestinamente, inclusive com duas moças da alta sociedade local.  Ao lado dessa formação clássica, Waldemar imbuía-se do folclore e cantigas populares nas viagens de férias que fazia à casa de parentes, em Manaus e no interior do Pará. Percorria os rios Amazonas e Tocantins, demorava-se nas ilhas de Marajó e do Mosqueiro.
 -- Talvez a canção OLHOS VERDES  -- busca Waldemar Henrique no fundo da memória – tenha sido minha primeira composição. Eu a fiz em Soure, nas férias, acompanhando-me ao violão. Devia ter uns catorze anos – nunca a esqueci, tanto que da melodia fiz a composição para piano que Arnaldo Rebelo gravou com o nome de VALSINHA DO MARAJÓ.



 ILHA DE MARAJÓ





UIRAPURU
ANY LIMA ( fotos do Estado do Pará)

Certa vez de montaria,
Eu desci o paraná
E o caboclo que remava
Não parava de falar
Ah, ah, não parava de falar
Ah, ah, que caboclo falador!
Me contou do lobisomem,
Da mãe d'água e do tajá
E disse do jurutaí que se ri pro luar,
Ah, ah, que se ri pro luar
Ah, ah, que caboclo falador!
Que mangava de visagem
que matou surucucu
e jurou com pavulagem
que pegou o uirapuru
ah, ah, que pegou o uirapuru 
Ah. ah ,que caboclo tentador
Caboclinho meu amor
Arranja um pra mim
Ando doida pra pegar
Unzinho assim
O danado foi-se embora
E não quis me dar
Vou juntar meu dinheirinho
Prá poder comprar
No dia que eu comprar
Esse danado vai sofrer
Vou desassossegar
O seu bem-querer
Ah, ah; seu bem-querer
Ah, ah; ora, deixa isso prá lá!


Fonte: NOVA HISTÓRIA DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA
ABRIL CULTURAL -1979
Imagens: GOOGLE
Vídeos: YOUTUBE

WALDEMAR HENRIQUE - II - MINHA TERRA



Waldemar divulgou suas primeiras composições para canto e piano em 1923-24, salientando-se FELICIDADE e MINHA TERRA (“Este sol, este luar,/ Estes rios e cachoeiras,/ Estas flores, este mar,/ Este mundo de palmeiras...”), que até hoje é seu maior sucesso: tornou-se peça obrigatória de todo cantor popular, prefixo de emissoras de rádio, presente nos parques de diversões, em propagandas, etc...

MINHA TERRA
Esse Brasil tão grande, amado
É meu país idolatrado Terra de amor e promissão
Terra de amor e promissão
 
Toda verde, toda nossa
De carinho e coração
Na noite quente, enluarada
O sertanejo está sozinho
E vai cantar pra namorada
No lamento do seu pinho
E o sol que nasce atrás da serra
A tarde inteira rumoreja
Cantando a paz da minha terra
Na toada sertaneja.

Este sol, este luar
Estes rios e cachoeiras
Estas flores, este mar
Este mundo de palmeiras
Tudo isto é teu, ó meu Brasil
Deus foi quem te deu
Ele por certo é brasileiro
Brasileiro como eu.





ELY CAMARGO - CANTORA GOIANA
RESGATE MUSICAL - RARIDADE


Então o pai, em mais uma tentativa de desviar o filho do caminho da música, empregou-o num banco. Sem tempo, o jovem deixou de estudar; mas passou a se destacar na vida social de Belém por sua assiduidade em concertos, teatros, serenatas e pastorinhas (para as quais fazia música).  Era pianista solicitadíssimo nas festas em casa de amigos.
Finalmente, em 1929, não aguentou mais: deixou o emprego e matriculou-se no Conservatório Carlos Gomes, dirigido por seu grande incentivador, o maestro italiano Ettore Bosio. Nessa época, Waldemar já contava com bom número de composições, algumas das quais foxtrotes, denotando influência estrangeira.
Nos primeiros anos da década de 30, trabalhou em alguns escritórios que lhe deixavam tempo para a composição e o estudo de piano, violão, violino, canto, harmonia, composição, instrumentação, acústica, etc. Paralelamente, ocupava-se da direção artística da Rádio Clube do Pará, onde acompanhava cantores ao piano sem ganhar nada – aliás, pagando (sua taxa de sócio). Em 1931 compôs os 21 números da revista NA CASA DA VIÚVA COSTA, com textos de Fernando de Castro e Antônio Tavernard: cançonetas, bailados, overture orquestral. A peça foi levada à cena em outubro, com muito êxito.
Dois anos depois, Waldemar promoveu no antigo Palace Teatro a NOITE DA CANÇÃO PARAENSE. O concerto reuniu os cantores Aldemar   Guimarães, Waldomira Queirós, Liberdade Neri Costa, Rosita Serra e Mara (irmã do compositor), além da orquestra de Oliveira Paz. Foram interpretadas apenas obras de Waldemar Henrique (que também tocou piano), entre as quais a partitura orquestral MUIRAKITAN





Mara da Costa Pereira sempre foi uma de suas intérpretes favorita. Ambos excursionaram por vários Estados e representaram artisticamente seu país em tournées pela América Latina e pela Europa. Mostraram com muito sucesso, a música autenticamente brasileira de Waldemar Henrique, arraigada sobretudo no folclore amazônico.
Fernando Tasso, um dos críticos que se manifestaram na ocasião, saudou Waldemar como  “um vitorioso da música regional”, que transfundiu em quanto brota de sua arte (...) toda essa esplendente natureza que o cerca e que seus olhos, desde menino, se acostumaram a querer bem”.  Observou ainda, nas composições apresentadas, “ rugidos de onça brava no coração da selva bruta”.
Em fins de 1933, Waldemar mudou-se para o Rio de Janeiro, com o vago propósito de sobreviver como pianista e compositor. Durante seis meses trabalhou como escriturário; depois assinou um contrato com a Rádio Philips. 
Foi Gastão Formenti quem pela primeira vez levou aos ouvidos cariocas os ritmos ainda desconhecidos das lendas, da fascinação e do sortilégio amazônicos, num disco da Victor.
Jorge Fernandes também gravou, pela Odeon, composições de Waldemar Henrique. 
Alda Verona recebeu o prêmio Victor de 1934 por sua interpretação de EXALTAÇÃO, de Waldemar.
Ainda em 1934, Waldemar escreveu a partitura, os poemas e algumas melodias da fantasia infantil O SAPO DOURADO, de Hekel Tavares.  As canções MINHA TERRA  MEU ÚLTIMO LUAR bateram recordes de vendas e o compositor firmou contrato com os Irmãos Vitale e com Vicente Mangione para a edição de suas obras.
Em discos Victor, Gastão Formenti gravaria ainda, de Waldemar: MEU ÚLTIMO LUAR, TEM PENA DA NEGA, FOI BOTO SINHÁ! E CABOCLA MALVADA – esta com acompanhamento de dois violões (Pereira Filho e Artur Nascimento), e bandolim (Luperce Miranda).





GILBERTO ALVES -  MEU ÚLTIMO LUAR


A participação de Waldemar Henrique no planejado filme MARÉ BAIXA aponta-o como um dos primeiros compositores brasileiros a terem música encomendada pelo cinema:
- O louvadíssimo diretor de LIMITE, Mário Peixoto, depois dessa experiência que o tornou famoso, convidou-me a escrever a trilha sonora do que seria seu segundo filme. Levou-me a conhecer os locais onde desenrolaria a história:  Mangaratiba, Angra dos Reis, Ilha Grande, Itibuí,  o grande mar de Sepetiba, a restinga da Marambaia. Conheci os futuros personagens, pescadores locais, andei de barco para sentir com eles o cotidiano humilde, ante um dos mais admiráveis cenários naturais que se possa imaginar. Ví-os dançar o jongo nas praias, anotei seus labores de pescaria, tudo para compor os leitmotive que deveria apoiar as cenas do filme. Dediquei-me à tarefa de corpo e alma, mas foi em vão. O filme não saiu: Mário enfezou-se com os financiadores...
Ele faria nova incursão pela música de cinema no fim da década de 50, compondo o tema musical e o leitmotive do personagem principal do filme O PRIMO BASÍLIO, de Antonio Lopes Ribeiro.

Fonte: NOVA HISTÓRIA DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA
ABRIL CULTURAL -1979
Imagens: GOOGLE
Vídeos: YOUTUBE

WALDEMAR HENRIQUE - III -BOI BUMBÁ

A primeira excursão artística de Waldemar Henrique a São Paulo deu-se em 1935. Na ocasião, fez amizade com Mario de Andrade, que o orientou quanto aos problemas de harmonização dos temas folclóricos. 
Ainda em 1935, Gastão Formenti gravou COBRA GRANDE e BOI-BUMBÁ com a Orquestra Victor Brasileira.
O batuque Boi-bumbá, letra e música de Waldemar Henrique é uma dança dramática (na qual se envolvem vários personagens), que narra a morte e a ressureição  de um boi.


BOI-BUMBÁ

Ele não sabe que o seu dia é hoje
O céu forrado de veludo azul-marinho
Veio bem devagarinho
Onde o boi ia dançar
Ele pediu pra não fazer muito ruído
Que o santinho distraído
Foi dormir sem celebrar
E vem de longe o eco surdo do bumbá, sambando
A noite inteira encurralado batucando
Bumba, meu “pai do campo”, oh, oh, oh!
Bumba, meu boi-bumbá.
Estrela Dalva lá no céu já vem surgindo
Acordou quem está dormindo
Para ouvir galo cantar
Na minha rua resta cinza da fogueira
Que levou a noite inteira
Fagulhando para o ar.





INEZITA BARROSO (1962)


Waldemar assinou contrato com a Rádio Tupi e escreveu treze canções, entre elas MORENA e ESSA NEGA FULÔ,  que pela primeira vez teve seus 88 versos musicados (única versão musical aceita por Jorge de Lima).
Mara e Waldemar foram beneficiados pela exigência de Getúlio Vargas  de música brasileira nos cassinos. Em 1936, fizeram uma excursão ao Nordeste e ao Norte, apresentando-se no Teatro da Paz, em Belém, no Teatro Amazonas, em Manaus, e no Clube Internacional do Recife, sob os auspícios da Instrução Artística do Brasil.


MORENA
Deixei cabana
Deixei meu gado
Pra ver morena
Do meu cuidado

Morena bela
Que tanto amei
A fé mais pura
 Eu te jurei

Eu já fui preso
Por uma açucena
Só por gostar
Da cor morena

A cor morena
É cor de prata
A cor morena
 É que me mata






LUCAS PROA  (2015) - MORENA


Waldemar compôs duas peças com o nome Morena. Uma de 1930,  ficou praticamente desconhecida; a outra, cinco anos mais nova, é uma canção folclórica com raízes em melodia e versos que o autor ouviu em criança na Ilha de Marajó. Embora esta segunda canção seja muito conhecida, só se tem registro de gravação em 1976. 

Voltando ao Rio de Janeiro, Waldemar recebeu de Carmen Santos encomenda de algumas canções para seu filme CIDADE MULHER. Entre os trechos trabalhados, compôs MACUMBA, um batuque baseado na melodia de TEM PERNA DE NEGA.
Ainda em 1936, venceu o concurso Melodias de Junho, instituído pelo Jornal “A Noite”  com a canção MEU BOI VAI-SE EMBORA. Para o programa comemorativo do primeiro aniversário  da Rádio Tupi, escreveu e apresentou com Mara e o Bando da Lua, a suíte folclórica CENA DRAMÁTICA DOS CONGOS. O auditório exigiu a repetição do número, num horário reservado à atração máxima, os Meninos Cantores de Viena.
As atividades de Waldemar Henrique no Rio de Janeiro giravam em torno da música brasileira de todos os gêneros, autores e épocas. Fez vários cursos, adquiriu conhecimento do repertório vocal do país e dominou o acompanhamento dos ritmos e dos efeitos seresteiros da canção de Villa-Lobos, Camargo Guarnieri, Luciano Gallet, Ernani Braga, Hekel Tavares, Capiba, Silva Novo. Nessa época compôs, entre outras, ROLINHA e COCO PENERUÊ; o tema musical da peça PARA ALÉM DA VIDA, de Alberto Rebello de Almeida; e a canção-tema da peça MALDITO ÓPIO, de Benjamim Lima. 
De 1938 são o maracatu HEI DE SEGUIR TEUS PASSOS... e o auto dramático PASTORINHAS DE BELÉM, sobre melodias que escrevera para os cordões da ilha do Mosqueiro.
Após um recital na Bahia, com Mara, em 1939. Waldemar Henrique fez produtivas pesquisas folclóricas sob a orientação de Carlos Chiacchio, José e Clarival Valadares, Silva Campos e o Pai-de-santo Joãozinho da Goméia. Conheceu a arte popular  das mais diversas regiões do país e recolheu fecundo material rítmico e melódico. Inspirado em pontos rituais afro-brasileiros, criaria NO JARDIM DE OEIRA, SEM SEUABALOGUM e ABALUAIÊ.
No Rio de Janeiro, organizou o quarteto vocal Brasil, composto por Fernando Lobo, Fernando Navarro Júnior, Silvio Godoy Alcântara e Sergio Salvador. No programa oficial HORA DO BRASIL,  o quarteto apresentou TREM DAS ALAGOAS, de Ascenso Ferreira e Waldemar Henrique.



WALDEMAR E MARA


Recomendados por Villa-Lobos, Waldemar Henrique e Mara seguiram em julho de 1941 para Buenos Aires, integrando um programa de propaganda de café mantido pelo governo brasileiro. Percorreram várias cidades obtendo um sucesso extraordinário.
De volta ao Rio, Waldemar lecionou, fez programas de rádio, e em 1943 foi nomeado,  pelo Interventor Magalhães Barata, diretor do Departamento de Imprensa e Propaganda de Belém do Pará, onde permaneceu por um ano.
A 9 de abril de 1946, no Rio, participou da fundação da Sociedade Brasileira de Autores, Compositores e Editores de Música (SBACEM), e secretariou a sessão que elegeu Ary Barroso presidente.  Passou então a preparar o repertório de canto brasileiro para intérpretes nacionais e estrangeiros.  
Compôs, em 1948, entre outras, VEM, MARIA para uma novela de Nestor de Hollanda, e SERESTA para o filme BEAUTÉ DU DIABLE, de Romain Lessage.


Fonte: NOVA HISTÓRIA DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA
ABRIL CULTURAL -1979
Imagens: GOOGLE
Vídeos: YOUTUBE

WALDEMAR HENRIQUE - IV - O CANTO DA AMAZÔNIA


No ano seguinte, o governador do Pará lhe ofereceu a direção do Conservatório Carlos Gomes. Mas a proposta coincidiu com a viagem do compositor à Europa, em missão do Ministério da Educação, atendendo convite (extensivo a Mara) do Secretariado Nacional de Informação de Portugal.
As apresentações em Lisboa e no Porto foram muito bem-sucedidas. Em Madri, os  artistas receberam um diploma assinado pela Princesa da Baviera, os Infantes de Espanha, compositores, intérpretes e críticos.  Na capital francesa, o recital teve o patrocínio da UNESCO, e os críticos Raymond Charpentier e Wladimir Janklevitch consideraram as composições de Waldemar Henrique mais nacionalistas que as de Villa-Lobos, visto não utilizarem processos harmônicos tradicionais europeus.
Retornando da Europa, Waldemar foi contratado para reger a orquestra da Companhia Teatral Folclórica Brasiliana, com a qual foi para Buenos Aires em setembro de 1951. Compôs melodias, arranjou motivos folclóricos e adaptou instrumentalmente composições de vários autores para os vinte quadros cantados e dançados do grande espetáculo que estreou a 19 de outubro no Teatro Astral.  Em novembro, apresentaram-se no Teatro Artigas, em Montevidéu. Na Faculdad de Humanidad del Uruguay, o compositor proferiu uma conferência para estudantes de folclore.
- Depois abandonei a troupe e voltei para o Brasil. E o empresário ficou me devendo dois meses de trabalho...
Nomeado para a Rádio Roquette Pinto, da Prefeitura do Rio de Janeiro, posteriormente assumiu a direção do setor de música orquestral e produziu diversos programas, entre os quais CONVITE AO FOLCLORE, louvado sem restrições pela crítica. Em 1953,  transferiu-se para o Departamento de Cultura, passando a promover conferências concursos e festivais de música brasileira.
Sob os auspícios do Ministério das Relações Exteriores, excursionou com o cantor Jorge Fernandes, em 1954, pelo Uruguai, Paraguai e Argentina. No ano seguinte, em missão do Itamaraty, seguiu para a Europa, tendo como intérprete Maria D’Apparecida. Atuaram inclusive na Emissora Nacional de Lisboa. No mesmo ano, Waldemar teve seu primeiro LP gravado, pela Decca parisiense, com ele acompanhando Maria d’Apparecida ao piano. Pouco depois, a cantora Alice Ribeiro também gravou músicas de Waldemar pelo selo francês Chants du Monde, com orquestrações de José Siqueira.
O primeiro LP nacional inteiramente dedicado a Waldemar Henrique (Sinter SLP 1064) teve como intérprete Jorge Fernandes, com o autor ao piano.
Para uma apresentação do Norte Teatro-Escola, durante o I festival Nacional de Teatros de Estudantes (1958), Waldemar escreveu a melodia-tema e outros números para MORTE E VIDA SEVERINA, de João Cabral de Mello Neto, obtendo por isso medalha de bronze do “Jornal do Comércio” pela melhor música de teatro do ano. Na mesma época, o compositor foi eleito por indicação de Radamés Gnatalli para a Academia de Música Popular do Rio de Janeiro.





Em 1965, Waldemar Henrique foi encarregado da direção do Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Mas estava disposto a voltar a Belém, o que fez quando foi nomeado diretor do Departamento de Cultura da Secretaria de Educação e Cultura do Pará. Em setembro de 1966, passou a responder pelo cargo de diretor do Teatro da Paz. Ocupou-se então em restituir ao teatro algo de seu antigo fausto. Trabalho feito com amor, que exigia dedicação quase integral.
-  Sinto a consciência doer quando verifico o abandono em que andam meus planos de compositor -  comentou ele na época. – quando  me aposentar, então sim, vou dedicar-me inteiramente à composição. 




O Museu da Imagem e do Som lançou em 1969, o LP  O CANTO DA AMAZÔNIA, na qual Maria Lúcia Godoy canta, além de obras de outros compositores, as sete primeira LENDAS AMAZÔNICAS, em arranjos de Guerra Peixe.
No ano seguinte, dentro das comemorações da Semana do Folclore, Waldemar Henrique recebeu do governo da Guanabara a medalha Sylvio Romero.
Em 1971, escreveu o tema musical VEREDA DA SALVAÇÃO, de Jorge Andrade, encenada pela Escola de Teatro da Universidade do Pará.
A convite do embaixador Gama e Silva, viajou depois para Lisboa, onde daria recitais de suas composições no Salão do Palácio da Foz.  O programa era variado com quinze canções, entre elas a estreante GESTA PRIMITIVA, sobre o poema de Leandro Tocantins. Ainda em 1972,  o Serviço de Teatro da Universidade Federal do Pará apresentou O CORONEL DE MACAMBIRA, bumba-meu-boi de Joaquim Cardoso musicado por Waldemar Henrique.  Mas suas composições rareavam: além de trabalhar exaustivamente na restauração do Teatro da Paz, Waldemar tinha contra si uma miopia progressiva. Mesmo assim, em dezembro de 1974 compôs música para o poema COBRA NORATO, de Raul Bopp.

terça-feira, 11 de dezembro de 2018

WALDEMAR HENRIQUE - V - TAMBATAJÁ






O disco CANÇÕES  DE WALDEMAR HENRIQUE, com a paraense Maria Helena Coelho Cardoso acompanhada pelo autor, foi gravado em 1976, sob o selo DEX.


MARIA HELENA COELHO


TAMBATAJÁ é uma das mais bem estruturadas  canções de Waldemar Henrique Composta em 1934 e logo muito divulgada em recitais públicos e programas radiofônicos, no entanto só foi levada ao disco em fins de 1948 , na voz da soprano Antonieta Fleury de Barros. Em 1976 a cantora Fafá de Belém lançou pela Polidor um disco com o título  de TAMBATAJÁ, incluindo essa canção de Waldemar e homenageando-o, no Teatro Amazonas, com um show homônimo. A interpretação mereceu elogios da crítica  e a total aceitação do público da MPB.  Diante disso, ele não poderia prever que ficaria sem receber os direitos autorais cabíveis. Aliás, várias obras de Waldemar Henrique vêm sendo consideradas folclóricas, mesmo pelas editoras.  Isso, além dos prejuízos econômicos que causa, concorre para certo desconhecimento do compositor como responsável por obras-primas injustamente consideradas “de domínio público”.
Ainda em 1976, Waldemar foi nomeado para o Conselho Estadual de Cultura do Pará e para a Academia Paraense de Letras; e sete das músicas incluídas no álbum nº 1 da série Música Popular do Norte, pela Marcus Pereira, eram de Waldemar Henrique. (No mesmo  álbum, a canção QUERER BEM NÃO É PECADO foi creditada a ele, mas seu autor é Oswaldo de Souza).
Apesar do trabalho exaustivo no Teatro da Paz e do agravamento da doença da vista, Waldemar Henrique ainda participou de encontros de compositores, artistas e pesquisadores e MPB, e recebeu homenagens: a Embrafilme fez um documentário sobre sua vida e obra; o Ministério da Educação e Cultura lançou um concurso de monografias a respeito do mesmo tema ( vencido por O CANTO DA AMAZÔNIA, do crítico mineiro Claver Filho).
Finalmente, no centenário do Teatro da Paz, - 15 de fevereiro de 1978 -, suas portas foram reabertas, concretizando-se um grande sonho do compositor paraense (que, aliás, também aniversariava). Entre as músicas do concerto de reabertura estava TAMBATAJÁ. Mas, ao se descerrar a placa comemorativa, faltava o nome do atual diretor.  O nome de quem mais lutou para, como o feiticeiro do boi-bumbá, devolver vivo o que lhe fora entregue morto. Faltava o nome de WALDEMAR HENRIQUE DA COSTA PEREIRA
                                                                   TAMBATAJÁ

Tambatajá
Me fez feliz
Que meu amor seja só meu
De mais ninguém
Assim o índio carregou sua “macuxi”
Para o roçado
Para a guerra
Para a morte
Assim carregue o nosso amor
A boa sorte
Que ninguém mais possa beijar
O que beijei
Que ninguém mais possa afagar
O que afaguei
Nem possa olhar dentro dos olhos
                                                                       Que olhei.     





CARMEN MONARCHA

. Espetáculo "Músicas de sempre" , Orquestra Sinfônica do Theatro da Paz, maestro Miguel Campos Neto.Theatro da Paz, outubro de 2015. Idealizado pelo Secretário de Cultura de Belém do Pará, Sr Paulo Chaves.
Essa canção do compositor paraense Waldemar Henrique, tem um lugar importante no repertório e no coração de Carmen Monarcha , pois sua mãe a cantava como canção de ninar em sua infância. Arranjo original de Robenare Marques.


      MEMORIAL



  TEATRO EXPERIMENTAL WALDEMAR HENRIQUE


Fonte: NOVA HISTÓRIA DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA
ABRIL CULTURAL -1979
Imagens: GOOGLE
Vídeos: YOUTUBE