sexta-feira, 22 de março de 2019

HEKEL TAVARES E A MÚSICA ERUDITA



Apesar de sua intensa produção popular, Hekel sempre ansiou ao erudito. Nesse sentido, foi incentivado por Martha Dutra (sua mulher desde 1934). Martha foi autora do argumento da fantasia infantil O SAPO DOURADO, musicada por Hekel e Waldemar Henrique e gravada em 1934 pela RCA. A partir daí ele abandonou gradativamente a canção, passando a moldar sua tendência nacionalista em painéis sinfônicos. No entanto, sua atitude não agradou aos companheiros, nem foi bem aceita pela crítica: em certo momento ele se sentiu desacreditado. Acabou vendendo seu tajupar para custear a edição de suas obras sinfônicas.




Após o Sapo Dourado, Hekel Tavares gravou na Odeon a novela O GAÚCHO, com versos de Vargas Neto; e finalmente, em 1935, ganhou seu espaço entre os eruditos com o poema sinfônico ANDRÉ DE LEÃO E O DEMÔNIO DO CABELO ENCARNADO, baseado em versos de Cassiano Ricardo (1895-1974) sobre um bandeirante (André) às voltas com Curupira.





Hekel Tavares viajou muito pelo Brasil, recolhendo farto material folclórico que utilizou em algumas de suas composições, como o poema sinfônico O ANHANGUERA, para orquestra,  coro misto, solistas e coros infantis.  O argumento é de Martha Dutra; os versos, de Murillo Araújo. Percorre a obra um intenso clima de lirismo e religiosidade, enriquecido por instrumentos de percussão dos índios tucunas (do alto Solimões) e poemas dos índios aritis como (Coza quereare cootiene taiquaêna – “ O velho arco quebrou-se”).  O Anhanguera foi gravado em 1954.





Voltado apenas para a música erudita, Hekel Tavares afastara-se definitivamente das canções. Mas jamais abandonou o espírito e os motivos da música regional. Embora tenha até negado seu cancioneiro – chegou a excluir a maior parte de suas canções ao idealizar a edição de suas obras completas, esse foi um gesto inútil, pois em cada uma de suas partituras eruditas há traços nítidos do estilo que o caracterizou como compositor de canções. Ali está despejada toda sua alma, ali o sentimento prevaleceu sobre a teoria, a emoção sobre a técnica.




RAPSODIA NORDESTINA

Em 1968 Hekel Tavares empenhava-se na composição de uma Rapsódia Nordestina e procurava entre colecionadores e pesquisadores uma sanfona “de fole gasto e som roufenho”, como ele mesmo dizia, do tipo usado pelos cegos cantadores das feiras do interior. No entanto, morreu no dia 8 de agosto de 1969, no Rio de Janeiro, deixando a peça inacabada. E morreu, sem nunca ter saído do Brasil: recusava todos os convites vindos do exterior. E, no entanto gostava de viajar, não importava o desconforto a que fosse submetido por longas estradas – de trem, de jipe, de jumento -, embrenhando-se pelo que há de mais Brasil. Dormia onde pudesse, comia o que houvesse. Queria mesmo era viver com seu povo, conhecer o que lhe ia no peito e expressar em música essas mágoas, essas alegrias.
O concerto para piano e orquestra em formas brasileiras, Opus 105 n.2 é a mais conhecida obra sinfônica de Hekel Tavares. Sempre incluído no repertório de grandes regentes e intérpretes brasileiros, esse concerto teve sua primeira audição  em 1944, na cidade paulista de Santos, e contou com a participação da pianista Guiomar Novaes.





“ eu nunca tinha visto o diabo. Ouvia falar. Gostava dele, por isso , agora vi.  Ninguém me tira da cabeça que é Hekel Tavares. É o diabo! Não o diabo das óperas, barítono, de topete vermelho, de cavanhaque, que faz ruindades. O diabo bom, aquele que foi menino desconfiado, esse que é homem de braços abertos... Hekel Tavares...Brasileiro. Do Norte. Carrega no coração todas as toadas do Brasil, a música que andava solta nos rios, nas florestas, nas montanhas, nas nuvens, nas crianças, nos pobres das feiras, nos pobres dos terreiros, em todos os pobres. Hekel Tavares mergulha a cabeça no coração para escutar. Escuta, E então conta”  ( Álvaro Moreyra).


Com a retirada da educação musical das escolas (1960) ficaram desconhecidos bons e importantes músicos que fizeram o brilhante passado de nossa música.

Fonte: Nova História da Música Popular Brasileira
           Abril Cultural - 1979
Fotos: Google
Músicas: Youtube

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