CÂNDIDO
DAS NEVES
ÍNDIO:
UM NOME OBRIGATÓRIO NAS ROMÂNTICAS SERESTAS DOS VELHOS TEMPOS
Quando Cândido das Neves começou a aparecer
com suas canções românticas, em breve
ele passaria a disputar com o poeta de
Luar do Sertão a honra de maior do
gênero, segundo o crítico da época, Francisco Guimarães – O Vagalume -, que tanto contribuiu para a fixação das
origens do samba, mas não vacilava em colocá-lo em plano superior.
Vagalume
tinha razão: nos recitais, Cândido das Neves era obrigado a se apresentar sempre
por último, porque quando cantava o público não queria deixá-lo ir embora, fazia-o voltar à cena repetidas
vezes, para cantar mais e mais. E não era apenas por seus versos apaixonados,
por sua voz, mas também por seu violão. Ele tirava efeitos tais do instrumento que parecia operar uma mágica,
transformando o violão em piano. Desde cinco anos ele tocava, e não era de
ouvido; escrevia e lia música, era professor. Fazia milagres com os alunos.
-
Cândido era um professor enérgico – conta sua viúva, Dona Débora Pinto das
Neves. - Puxava pelo aluno, às vezes
dava, em vez de uma hora, como o combinado, mais meia hora. Eu ficava boba de
ver o progresso de seus alunos.
Ele não era índio, e
sim negro, filho de negro. E puxava ao pai em muita coisa: no amor à música, no
poder de emocionar o povo, até mesmo na forma brutal de morrer. Quando Cândido
nasceu, a 24 de julho de 1899, o pai já tinha fama: Eduardo das Neves, o grande
palhaço negro, arrebatava multidões com suas músicas, em que celebrava fatos da
época. Uma noite, no Teatro Maison Moderne, o palco ficou juncado de chapéus e
flores, Eduardo das Neves foi carregado pelo público. Ele chegara do Norte e
cantava uma exaltação a Santos Dumont, que contornara a Torre Eiffel com seu
balão Demoiselle. O povo delirou quando Eduardo das Neves atacou a canção que muitas gerações entoariam:
“ A Europa curvou-se ante o Brasil
E clamou parabéns
Em meigo tom,
Brilhou lá no céu
Mais uma estrela:
Apareceu
Santos Dumont...”
Palhaço,
cantor, compositor, Eduardo das Neves (1874-1919) haveria de encaminhar o filho
também pelo caminho da arte, que lhe dera tanta glória. A resolução foi tomada no dia em que viu o
pequeno Índio, como o chamava, a brincar com o violão, instrumento então considerado
sem nobreza. Ele afastou-o do violão,
mas resolveu dar-lhe educação musical. E
não apenas isso: fez questão de que o filho estudasse, concluísse o ginásio,
procurasse aprender muito.
A
formatura no ginásio abalou muito o jovem Cândido. O pai viera de Minas, onde
vivia, para assistir à diplomação. No Rio, como era natural, convidaram-no para
dar ao menos um show num teatro da Praça Tiradentes. Pouco antes da meia-noite,
quando voltava do teatro e chegava à
pensão onde se hospedara, Eduardo das Neves começou a passar mal. Cândido saiu
para chamar uma ambulância; inútil: o pai morreu antes de receber qualquer
socorro.
O episódio definiu o
rumo da vida de Cândido – não seguiria a carreira circense. Começaria como o
pai, sim, mas na Estrada de Ferro Central do Brasil, como praticante de agente. E lá na Central, onde o pai fora
guarda-freios, ele acabaria por levar mais longe a tradição musical da família.
Primeiro, como mestre-de-harmonia do rancho O
Prazer das Morenas, da Saúde.
Depois, compondo para carnaval, mas sem muito sucesso. Em sua importante
obra O
Carnaval Carioca através da Música, Edigar de Alencar registra apenas uma
vez o nome de Cândido das Neves, como autor
de uma marcha “bastante divulgada nesse abundantíssimo carnaval de boas
marchas e belos sambas (o de 1934): A MAIOR DESCOBERTA, gravada por
Almirante e Castro Barbosa. Cândido explorava um grande filão carnavalesco – a
mulata.
Fonte:
Nova História da Música Popular Brasileira
Abril cultural – 1978
Fotos:
Google