quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

OS PRIMITIVOS NA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA - PARTE IV - OS CHORÕES E O TEATRO



 

OS CHORÕES E O TEATRO

PEDRO GALDINO (?)

PAULINO SACRAMENTO (1880-1926)

 PEDRO SÁ PEREIRA ( PORTO ALEGRE- 25/11/1892 RIO DE JANEIRO 4/7/1955)

 

A partir do início do século XX, os velhos chorões tocadores de valsas, schottisches e polcas nas festas de casa de família passaram a encontrar mais facilmente oportunidades de se tornarem profissionais.

Em 1902 começaram a ser gravados discos de gramofone, e o teatro de revista, que vinha crescendo desde fins do século XIX, cada vez mais pedia músicos para suas orquestras e mais composições para animar os quadros de musicados das peças alusivas a temas da atualidade.

PEDRO GALDINO 

Entre esses músicos de choro, que chegaram a ver perpetuadas em discos algumas das melhores provas do seu talento, estava PEDRO GALDINO, operário de uma fábrica de tecidos do bairro carioca de Vila Isabel. Nascido na segunda metade do século passado, Pedro Galdino – preto de origem popular urbana inequívoca, como revela sua condição de operário têxtil – aprendeu a tocar flauta no auge da influência de Calado, o que significa dizer que era um virtuosista, preocupado em dificultar nos solos, o acompanhamento improvisado dos violões e do cavaquinho.
Os dados pessoais sobre Pedro Galdino são muito poucos. Ary Vasconcelos afirma em seu livro Panorama da Música Popular Brasileira que foi mestre da banda da Fábrica Confiança de tecidos, de Vila Isabel, e que vinha de uma família de músicos. Mas as poucas músicas que chegou a deixar gravadas em discos da Casa Faulhaber explicam perfeitamente a razão do seu prestígio entre os chorões cariocas dos primeiros vinte anos do século XX.
Ary Vasconcelos aponta como a mais famosa das composições de Pedro Galdino a música MEU PENSAMENTO, transformada, depois de receber letra de Tuttemberg Cruz, na canção OLHOS DE VELUDO. Em disco Falhauber, porém Pedro Galdino gravou schottisches como ADÉLIA, valsas como PASTORINHA e polcas como FLAUSINA e JOCOSA.

  

PAULINO DO SACRAMENTO


Um pouco mais novo que Pedro Galdino, o pistonista PAULINO DO SACRAMENTO (1880-1926), também músico de banda, alcançaria um degrau a mais na carreira: além de conseguir gravar algumas de suas músicas, pôde atingir o estágio de profissionalização, tornando-se maestro de orquestra do teatro de revista carioca. Contemporâneo e companheiro do Maestro Francisco Braga no Colégio dos Meninos Desvalidos, em cuja banda tocaram juntos. O início da carreira do jovem Paulino do Sacramento ia ficar ligado ao do grande maestro: quando Braga, já regente da banda do colégio, ganhou uma bolsa para especializar-se em teoria em Paris, foi Paulino o indicado para substituí-lo.
Como o teatro de revista estava, no início do século, precisando de músicos capazes de escrever na pauta (a falta de maestros brasileiros obrigava o teatro musicado a servir-se de estrangeiros como o português Gomes Cardim e o espanhol Júlio Cristóbal), Paulino do Sacramento pôde transferir-se para as orquestras de polo de teatro.
A partir da revista O Rio Civiliza-se, em 1912 (ao que tudo indica sua primeira contribuição para o teatro musicado), o nome de Paulino do Sacramento não deixa mais de figurar nos cartazes da Praça Tiradentes, produzindo partituras para revistas, operetas e burletas até 1926, quando morre a 9 de março.
O ano da morte de Paulino do Sacramento marca por coincidência, o momento de glória de outro músico de orquestra de teatro de revista, seu contemporâneo o maestro 
                                                       PEDRO DE SÁ PEREIRA

Temperamento romântico (era, com seu 1,60 m de altura, muito tímido e franzino), especializara-se no gênero que a partir da década de 20 se convencionara chamar de CANÇÃO SERTANEJA.
A influência da poesia de Catulo da Paixão Cearense chegara também ao teatro de revista, onde as figuras idealizadas dos caboclos começavam a queixar-se do desprezo das morenas com uma insistência que contaminou irremediavelmente a música popular brasileira seguramente até a década de 40. Pois foi ao compor uma dessas canções para a revista COMIDAS, MEU SANTO!, estreada no Teatro São José, a 1º de setembro  pela companhia da atriz Margarida Max, que SÁ PEREIRA ia conseguir lançar seu nome muito além dos palcos do teatro musicado.
A canção-modinha (como dizia a partitura), cantada na revista pelo barítono Roberto Vilmar, foi a célebre CHUÁ-CHUÁ cuja letra era do revistógrafo Ari Pavão, e que ainda hoje é lembrada pelo seu estribilho:

“E A FONTE A CANTÁ

CHUÁ, CHUÁ...
E AS ÁGUA A CORRÊ...
CHUÊ, CHUÊ...”

Quando, a partir da década de 30, uma profusão de sambas e de marchas invadiu o teatro de revista com SINHÔ e toda uma geração de compositores das camadas mais populares do Rio, Sá Pereira –silenciosamente, como era seu feitio –retirou-se com o repertório das suas canções debaixo do braço e foi tocar o seu Chuá,Chuá para os passageiros dos navios da Companhia de Navegação Costeira, como pianista de bordo.  

                                                

CHUÁ, CHUA

(Pedro Sá Pereira e Ary Pavão)

Deixa a cidade, formosa morena,

Linda pequena e volta ao sertão
Beber a água da fonte que canta
Que se levanta do meio do chão
Se tu nasceste cabocla cheirosa
Cheirando a rosa do peito da terra
Volta pra vida serena da roça
Daquela palhoça
Do alto da serra
E a fonte a cantar
Chuá, chuá
E as água a correr
Chuê, Chuê,
Parece que alguém
Que cheio de mágoa
Deixasse – que há de dizer –
A saudade
No meio das águas
Rolando também.
A lua branca de luz prateada
Faz a jornada no alto dos céus
Como se fosse uma sombra altaneira
Da cachoeira
Fazendo escarcéus
Quando essa luz lá na altura distante
Loira, ofegante
No poente a cair
Dá-me essa torva que o pinho descerra
Que eu volto pra serra
Que eu quero partir.

Fonte: Nova História da Música Popular Brasileira

           Abril Cultural - 1978
                                                      

 

 

 

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