ALVARENGA
E RANCHINHO
Murilo
Alvarenga nasceu em Itaúna, Minas Gerais, em 22 de Maio de 1911 e faleceu em
São Paulo, em 18 de Janeiro de 1978.
Diésis
dos Anjos Gaia, o Ranchinho, nasceu em Jacareí, S. Paulo em 23 de Maio de 1912, e faleceu em são Paulo em 6 de Julho de 1991.
Alvarenga
e Ranchinho constituem a dupla mais famosa do país, e também a mais politizada,
a que melhor soube lidar com a sátira popular de cunho político – o que lhe
valeria anos de constante perseguição e censura por parte dos órgãos
repressivos do Estado Novo de Getúlio Vargas, além de curtas temporadas no
xadrez.
Sobrinho
de empresário circense, já aos onze anos Alvarenga trabalhava como trapezista e
malabarista. Mais tarde tentou a vida como cantor de tangos em Santos, onde
conheceu em 1931 o Diésis, aquele que seria o primeiro Ranchinho (apelido que ganhou de tanto cantar No Rancho Fundo). Formada a dupla,
começam a se exibir em circos, interpretando músicas caipiras. Em 1933
apresentam-se com a Companhia Bataclã em São Paulo e em 1934 atendem a um
convite do maestro Breno Rossi para cantar na Rádio São Paulo. Formam com Silvino Neto o trio Mosqueteiros
da Garoa (que pouco durou, apesar do sucesso).
Em
1935 refaz-se a dupla com Alvarenga e Ranchinho saindo vitoriosos do concurso
de músicas carnavalescas de São Paulo, com a marchinha SAI, FEIA:
“sai, feia, da minha frente,
Sai feia, que isso pega na gente”.
No
mesmo ano são convidados pelo Capitão Furtado para trabalhar no filme FAZENDO
FITA, de Vittorio Capellaro. Ligaram-se artisticamente a ele, de sorte que em
1936 já estavam no Rio de Janeiro, formando
a Trinca do Bom Humor (Alvarenga,
Ranchinho –Capitão Furtado)– na qual a função principal do Capitão Furtado
era escrever “causos” e piadas para a dupla de violeiros. Depõe o próprio
Capitão, rememorando a época:
-
Imagine você que cismei de fazer uma visita à Rádio Tupi. Terminadas as gravações
desse dia, na Odeon, fomos para a Rua Santo Cristo, onde chegamos justamente no
momento em que Dona Silvia Autuori – a meiga Tia Chiquinha, da HORA DO GURI –
lia uma crítica de “ O Estado de São Paulo”, a respeito de uma peça minha
levada à cena no então respeitável Teatro Santana, da Rua 24 de Maio. Fui
recebido como caipira que sabia escrever, e o Dr. Ayres de Andrade não teve
dúvida em nos ceder um espaço para a visita. Sempre com o vento a favor, nossa
atuação agradou também ao exigente Assis Chateaubriand, que – pra sorte nossa –
estava ouvindo a emissora dele, e recomendou que se empregassem “esses
meninos”.
Fo
assim que obtiveram contrato para se apresentar num horário vespertino, na
Rádio Tupi (Hora do Guri), com sucesso imediato.
Ao
contrário do que ocorre com a maioria das duplas, Alvarenga e Ranchinho
estrearam primeiro no cinema e depois no
disco. Foi em 1936, na Odeon, num 78 rpm com Itália e Abissínia, de Alvarenga, Ranchinho e Capitão Furtado
“ A intália e a Bissínia já tão dando o que falar:
Inda hoje teve um pega, lá no fundo do quintar!
A Bastiana e o Seo Beppe, já garraro a se unhar!
Pelo jeito que eu tô vendo, isso vai acaba mar!”
e Liga das Nações, de Alvarenga e
Ranchinho
“um brasileiro, besteira;
Dois brasileiros, muamba”.
Caipiras
mordazes, observando o início de um segundo conflito mundial. Recorda Capitão
Furtado:
-
Era uma sátira inocente, porém alguém pôs na cabeça do Dr. Byington Jr. que não
ficava bem uma firma de nome inglês estar fazendo piada de uma guerra entre
dois países que mereciam respeito. Acatando essa observação, o disco que Nhá
Zefa e Laureano tinham gravado foi cancelado. Nessa altura já Alvarenga e
Ranchinho estavam cantando em dupla, tendo acolhido essa moda no repertório,
com absoluto sucesso.
Ainda
em 1936 a dupla partiu para Buenos Aires, onde cumpriu temporada no Teatro
Smart. De volta ao Rio de Janeiro, participaram em 1939 da primeira experiência
de transmissão de televisão, na Feira de Amostra. Contratados pelo Cassino da
Urca, no Rio, exibem-se com sucesso até o fechamento daquela casa de diversões
em 1946. Chegaram a se apresentar junto com Carmen Miranda, e foram assistidos
por Bing Crosby e Walt Disney. A seguir, abriram uma boate em Copacabana, com o
nome da dupla, e lá permaneceram até 1950.
No
Cassino da Urca, as paródias logo deixaram de glosar a situação internacional,
para deterem-se nos políticos nacionais mais em evidência.
A
propósito de HISTÓRIA DE UM SOLDADO,
lundu satírico-político que chegaram a gravar na Odeon, conta-se que em pleno
Estado Novo, ao se apresentarem num show, cantaram a música, cujos versos
finais diziam: “e o Getúlio, que é homem ativo, pega a papelada, e manda pro
arquivo”, e fizeram o seguinte comentário:
Ranchinho
– Não tem medo de mexer com os homens da lei?
Alvarenga
- Eu tô de acordo com o presidente que
diz “ a lei, ora, a lei”.
Foram
presos e a história acabou chegando aos ouvidos do ditador, que os mandou
chamar “em palácio” para cantar também diante dos ministros as sátiras
políticas, especialmente as que falassem dele, Getúlio Vargas. Ouviu, achou
graça e mandou liberar as sátiras em todo o território nacional. Segundo
Ranchinho, Getúlio teria dito:
-
podem continua, desde que seja uma crítica razoável, sem ofender a moral ou o
físico das pessoas.
A
dupla também não descuidou do gênero carnavalesco, e assim é que em 1938
fizeram bastante sucesso com a marchinha SEU
CONDUTOR ( Alvarenga- Ranchinho-
Herivelto Martins):
Seu condutor, Dim-dim
Seu condutor, Dim-dim
Para o bonde pra descer o meu amor
No
mesmo ano, Ranchinho se afasta de Alvarenga e este procura outro parceiro.
Escolhe José Vono, e troca seu
pseudônimo (Zé Leiteiro) para Bentinho
(lembrando Joaquim Bentinho). Juntos gravaram um disco, que tinha, de um lado, Ó Bela (Capitão Furtado e Peter Pan) e,
do outro Bombeiro (Alvarenga e
Bentinho).
A partir de 1939, todos os
parceiros de Alvarenga recebiam o nome de Ranchinho, mantendo a “marca registrada” da dupla. Foram três os Ranchinhos: Diésis Gaia, o
primeiro, Delamare de Abreu, irmão de
Alvarenga por parte de mãe e que se manteve na dupla apenas dois meses, e
Homero Souza Campos o ex Nhô Pinta
Que
permaneceu na dupla de 1965 a 1978, quando faleceu Alvarenga.
Em
1940, após apresentações em Porto Alegre,
receberam o apelido de Os milionários
do Riso (e Alvarenga também já era afetuosamente
chamado de “ Pai dos Caipiras”). Foi ainda naquele ano que lançaram um de
seus maiores sucessos humorísticos:
ROMANCE DE UMA CAVEIRA ( Alvarenga, Ranchinho, Chiquinho Sales).
“Eram duas caveiras que se amavam
E á Meia-noite se encontravam...”
No
mesmo estilo lançaram três anos depois o “ Canto Tétrico” (designação que aparece no selo do
disco) DRAMA DE ANGÉLICA,
De
Alvarenga e M. G. Barreto
“ ouve meu cântico,
quase sem ritmo,
Na
voz de um tísico, magro, esquelético...”
Alvarenga
e Ranchinho participaram de 49 filmes entre os quais a célebre “série das
frutas “ – Abacaxi azul, Laranja da China e Banana da Terra. Em vista do repertório de sátiras políticas
foram muitas vezes convidados a participar de campanhas eleitorais como as de
Ademar de Barros, Juscelino Kubitschek e Lucas Nogueira Garcez.
Em
1975 apresentam-se em São Paulo, na
boate Igrejinha, com o show Proibido para Jovens, comemorando os 45 anos de
atividade da dupla. E, procurado pelos jornais, Alvarenga se queixava com
conhecimento de causa:
- existe, na verdade, um
certo preconceito urbano contra a música caipira e sertaneja no Brasil. Já
confirmei isso pessoalmente: como se não bastasse o horário pré-determinado,
numa faixa da tarde e da manhã, em que as rádios-emissoras transmitem o gênero,
a segregação existe nas próprias casas revendedoras de discos. Eu não choro de
barriga cheia. Quando aponto esta discriminação, acho mesmo que a questão
envolve a defesa de nossa cultura. Qualquer casa de discos vende música caipira
norte-americana, mas brasileira só pode ser encontrada em casas especializadas.
E,
naquele show de 1975, cantaram uma paródia
de Disparada, de Geraldo Vandré, que é um resumo da própria carreira da dupla
às voltas com a censura:
“Já falei de Janio Quadros, e também do Juscelino
Já falei do Seo Lacerda, e também do Ademar.
Mas quando falei do Getúlio, nessa hora eu me dei mar.
Na cadeia eu já fui rei, só andava de rádio-patrulha
Mas um dia eu me mudei, e andei de lá pra cá.
Muitas coisas aprendi, se um político tá perto
Vou cantar noutro lugar”.
Numa
quarta-feira, 18 de janeiro de 1978, morre Murilo Alvarenga, o Pai dos
Caipiras. No cemitério, dois dias depois, três Ranchinhos órfãos eram colhidos
de surpresa pela imprensa: “ Diésis Gaia falava que esperava ser lembrado pelos
empresários, mesmo cantando sozinho.
Delamare estava calado, não tinha planos. Homero dizia que iria esperar os convites para
voltar à televisão como ator em programas humorísticos, ou então gravar solos
de viola e violão, porque para ele era “muito mais fácil voltar para o rádio do
que arranjar outro Alvarenga, e que nos próximos dias ira desfazer os 41 contratos
já assinados para shows, além dos nove programas de televisão”.
Fonte:
Nova História da Música Popular Brasileira
Abril
Cultural – 1978
Google: Enciclopédia
Wikipédia
Vídeo: youtube - Drama de Angélica
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