DORIVAL CAYMMI – CENTENÁRIO DE
NASCIMENTO- 2014
PARTE III
Carnaval era tempo de
muita alegria – fantasiar-se, dançar, jogar confete e serpentina e - por que
não? – ganhar dinheiro. Assim pensava Wallace Downey, americano produtor de
cinema, que aproveitava a época para lançar suas pretensiosas produções
carnavalescas. Assim foi Alô, Alô Brasil
e Alô, Alô Carnaval. Para o carnaval
de 1939 ele preparava nova produção com Carmen Miranda, - Banana da Terra, como convinha a um país tropical.
Wallace não concordou com o preço pedido por Ary Barroso,
para Carmen cantar na Baixa do Sapateiro, e o cenário baiano ficou sem
música. Foi quando alguém se lembrou de
um mulatinho que andava fazendo sucesso com um samba que encaixa perfeitamente
no cenário. E, além disso, era baiano mesmo. Assim, O QUE É QUE A BAIANA TEM? Entrou para o filma Banana da Terra, na
voz de Carmen Miranda, tudo com muito sucesso e grande repercussão, a ponto de
popularizar a palavra “balangandãs”, antes pouco conhecida no sul do país. A
princípio, uma penca de pequenos fetiches negros, feitos em prata e ouro,
acabou designando qualquer enfeite de colares, pulseiras, etc
O QUE É QUE A BAIANA TEM?
O que é que
a baiana tem?
O que é que
a baiana tem?
Tem torço de seda, tem!
Tem brincos
de ouro, tem!
Tem pano da Costa, tem!
Tem bata rendada,
tem!
Pulseira de ouro, tem!
Tem saia engomada, tem!
Sandália enfeitada,
tem!
Tem graça como ninguém...
Como ela requebra bem...
Quando
você requebrar
Caia por cima de mim...
Caia por cima de mim...
Caia
por cima de mim...
O que é que a baiana tem?
O que é que a baiana tem?
Só vai no Bonfim quem tem...
Só vai no Bonfim quem tem...
Um rosário de ouro
Uma bolota assim
Quem não tem balangandãs
Ô não vai no Bonfim...
Ô não vai no
Bonfim...
Entraram os balangandãs e Caymmi para o teatro na peça
musical Jouloux e Balangandãs, de Henrique Pongetti, com a música O MAR. O elenco era de amadores
da alta sociedade, mas Caymmi entrou porque a senhorita que iria interpretar
sua canção praieira desistiu da
ideia.
O MAR
O mar...
Quando
quebra na praia...
É bonito... é
bonito...
O mar...
Pescador
quando sai
Nunca sabe
se volta
Nem sabe se
fica...
Quanta gente
perdeu
Seu
marido... seu filho...
Nas ondas do
mar
O mar...
Quando quebra
na praia
É bonito...
é bonito...
Pedro vivia
da pesca
Saía de
barco seis horas da tarde
Só vinha na
hora do sol raiá
Todos
gostavam de Pedro
E mais do
que todos Rosinha de Chica
A mais
bonitinha, de todas mocinhas
Lá do arraiá...
Pedro saiu
no seu barco
Seis horas
da tarde
Passou toda
a noite
E não veio
na hora do sol raiá
Deram com o
corpo de Pedro
Jogado na
praia
Roído de
peixe
Sem barco,
sem nada
Num canto
bem longe
Lá do
arraiá...
Pobre
Rosinha de Chica
Que era
bonita
Agora parece
que endoideceu
Vive na
beira da praia
Olhando pras
ondas
Rodando...rodando...
Dizendo
baixinho
Morreu...morreu...
oh!
O Mar....
Rádio, cinema, teatro,
faltava o disco. Novamente apadrinhado por Almirante, em fevereiro de 1939, a
voz e a música de Caymmi eram gravadas na Odeon: O QUE É QUE A BAIANA
TEM? e A PRETA DO ACARAJÉ, ambas em
dupla com Carmen Miranda. Em agosto saía RODA
PIÃO, cantada pela “baianinha” e pelo autor, e, em setembro, RAINHA DO MAR e PROMESSA DE PESCADOR,
com o próprio Caymmi.
Sem pensar muito,
assinou um contrato com a Odeon, comprometendo-se a gravar mensalmente. Baiano
muito tranquilo, que não raro levava meses para compor uma música, Caymmi
acabou dispensado da Odeon em 1941. Foi gravar na Colúmbia, voltando à Odeon só
em 1946. No rádio, a mesma coisa: depois de uma temporada na Mayrink Veiga,
voltou em 1941 para a Tupi, onde ficaria até 1950.
Durante todos esses
anos não gravou muito; apenas o suficiente para deixar seu nome como um marco
na história de nossa música. O MAR, É DOCE MORRER NO MAR ( com letra
de Jorge Amado), A JANGADA VOLTOU SÓ,
VOCÊ JÁ FOI À BAHIA?, ROSA MORENA, MARINA e tantos outros clássicos foram
registrados, em sua própria voz, com os Anjos do Inferno, com Dick Farney. Os
moços cultos da época, tal como, mais tardes, os universitários diante da bossa
nova, viam nas canções de Caymmi o que de mais avançado havia em música
popular. Ele sabe por que - “cheguei aqui com um violão tocado de maneira
esquisita para a época. O violão era tocado então em acordes perfeitos,
quadrados. Sempre tive a tendência a alterar os acordes perfeitos.
Eu tirava o dedo de
uma corda e punha na outra procurando um som harmônico diferente. Havia dois
solistas que faziam aproximadamente o mesmo que eu, com uma diferença: eles
eram estudiosos de música, eu não. Eram Aníbal Sardinha, o Garoto, e Laurindo
de Almeida, que se tornou, nos Estados Unidos um grande solista de Jazz. As minhas “cavações” harmônicas já eram
estranhas para meus amigos lá na Bahia. Fui chamado de violonista que só tocava
em mi maior, mas meu violão agradou tanto que alguns compositores alteraram
finais de suas canções à minha maneira” .
Anos mais tardes, suas
“cavações” harmônicas seriam vistas como precursoras da bossa nova.
Fonte: Nova História
da Música Popular Brasileira – 1976 – Abril Cultural
Vídeo - O Mar - youtube
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