quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

BEETHOVEN - 250 ANOS - PARTE V

  

NA COMPLETA SURDEZ,  ABATIMENTO E DESILUSÃO



Nos primeiros anos da segunda década do século XIX , Beethoven entra em profundo abatimento e desilusão. Testemunhas da época retratam-no  como um homem desanimado, enfermo, obcecado pela morte e com ideias suicidas.  Problemas materiais o assaltam, em virtude da desvalorização do florim, o que afeta consideravelmente a pensão anual recebida de seus patronos. Embora eles se proponham a valorizá-la, isso não se concretiza, pois o príncipe  Lobkowitz está arruinado financeiramente e o príncipe Kinsky morre em um acidente de cavalo.  Além disso, a “Carta à Bem-Amada Imortal”, escrita provavelmente em 1812, exprime seu desencanto com o sonho da realização amorosa. No mesmo ano, em Teplitz, conhece Goethe, a quem devotava grande admiração. Mas o encontro, promovido por Bettina von Arnim,  é decepcionante. Conta-se que os dois, passeando em Teplitz, encontram a família real. O poeta ter-se-ia inclinado respeitosamente, sendo, por isso, recriminado por Beethoven. Mais tarde, o compositor escreveria: “ Goethe aprecia a atmosfera da Corte mais do que convém a um poeta.”

Pouco depois, toda a Europa entra em fase de contra-revolução; o congresso de Viena (1814) restaura as monarquias derrotadas por Napoleão e ocasiona a volta dos antigos privilégios feudais. Beethoven se desiludira com Napoleão, mas seus ideais de liberdade, igualdade e fraternidade continuam vivos. A Europa da Santa Aliança, dominada pelo conservadorismo político e religioso, não é aquela que seu republicanismo convicto esperava ver realizada.

Sobre esse sombrio pano de fundo, delineiam-se novos infortúnios familiares. O irmão Karl falece em 1815 e lhe deixa recomendações para que se torne tutor do filho, então com nove nãos de idade. Segue-se uma longa e desgastante disputa judicial  com a mãe do menino, que Beethoven só consegue vencer em 1820. Afeiçoa-se profundamente ao sobrinho e transfere para ele seus sentimentos paternais.  Em troca, só desgostos. O jovem Karl passa a explorar a disputa entre a mãe e o tio, cria problemas e expressa publicamente a falta de afeto em relação ao compositor. Deixando tudo mais triste, a surdez torna-se absoluta ao findar a segunda década do século. Beethoven não escuta mais nada. No lugar da música, o silêncio. E vê-se obrigado a usar pequenos cadernos de conversação, onde os amigos fazem perguntas e observações, que ele lê para depois responder oralmente.  Envelhecido e doente, nem o êxito retumbante de suas composições em toda a Europa serve para lhe despertar qualquer emoção de júbilo.

 Nem o alegra a medalha de ouro que o rei da França manda cunhar para homenageá-lo pela profunda beleza da MISSA SOLENE EM RÉ MAIOR, composta entre 1818 e 1822. Sua produtividade, do ponto de vista quantitativo, cai consideravelmente, mas a qualidade cresce na mesma proporção. As obras desse período são extremamente interiorizadas, abstratas e de extraordinária densidade musical, como as quatro últimas SONATAS PARA PIANO (OPUS106, 109, 110 E 111), OS QUARTETOS DEDICADOS AO PRÍNCIPE GALITZINE, as VARIAÇÕESSOBRE UMA VALSA DE DIABELLI, OPUS 120, e  a NONVA SINFONIA (“CORAL”), verdadeiro testamento sinfônico.

O fim se aproxima. Os problemas com o sobrinho chegam ao auge no verão de 1826. Karl tenta o suicídio e põe a culpa no compositor:  “tornei-me pior porque meu tio queria me tornar melhor”.  Os amigos de Beethoven o aconselham a se desfazer da tutela do sobrinho – e ele concorda, com profunda tristeza. Em dezembro, do mesmo ano, contrai a pneumonia dupla, que não mais o deixará, complicando-se com cirrose hepática e hidropisia. Em março do ano seguinte, seu estado torna-se desesperador. No dia 23, diz a Stephan Breuning, velho amigo desde os tempos da adolescência em Bonn:

“Plaudite amici, comoedia finita est” - “Aplaudi, amigos, a comédia terminou).  A 26, expira. Três dias depois, seu funeral é acompanhado por uma multidão de vinte mil pessoas. Franz Grillparzer, o maior dramaturgo austríaco da época, faz a oração fúnebre. E Schubert carrega uma tocha.

 



A  Natureza esteve sempre presente na vida de Beethoven, até seus últimos anos. Com frequência, o compositor se refugiava nos arredores de Viena, onde encontrava paisagens campestres que lhe reconfortavam o espírito. Por isso mesmo, a natureza lhe inspirou algumas de suas composições, entre as quais o exemplo mais conhecido é a Sinfonia “Pastoral”. Beethoven, porém, fazia questão de frisar que não pretendia pintar a natureza, mas expressar os sentimentos despertados por ela.

 

“ O fim último da verdadeira música é a expressão da essência das coisas. Penetrar profundamente a essência íntima das coisas, até extrair-lhe um raio de luz, isto é, penetrar, em seu íntimo significado, as paixões do coração humano e as maravilhas da natureza – esse foi o objetivo do nosso grande Beethoven e sua obra.” – RICHARD WAGNER.


FONTE:  MESTRES DA MÚSICA                                                                                ABRIL CULTURAL– 2ª EDIÇÃO – 1982                                                                IMAGENS: GOOGLE              

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