Nos
primeiros anos do pós-guerra, o rádio sofre uma invasão de autores improvisados
e intérpretes de segundo time, atraídos pelo lucro do carnaval. Inicia-se a
fase da caitituagem (expressão criada
por Aracy de Almeida para identificar o
trabalho dos compositores a fim de que suas músicas conseguissem sucesso).
Era
também a época da propina aos programadores das rádios, das compras de parceria
em troca de promoção das músicas. Os cantores e compositores mais pobres eram
obrigados a trabalhar de graça para divulgar suas músicas. Com o aparecimento
da televisão, a situação tende a se agravar. Essa necessidade de trabalhar as músicas para que atingiam
sucesso, além de afastar os melhores compositores, refletiu em sua própria
criação. As letras são cada vez menores e mais simples, para que o rádio e a
televisão possam tocar mais e para que sejam mais rapidamente digeridas pelo
público.
Durante
a década de 60, a música de carnaval começou a entrar em decadência. Muitos
aspectos foram solicitados para explicar tal fenômeno, mas deve-se também
pensar na possibilidade de exaustão de suas formas tradicionais – com a
excessiva repetição dos esquemas e cacoetes das marchinhas e dos sambas
carnavalescos. E mesmo o carnaval tornou-se uma festa com outro semblante, nos
salões e nas ruas (onde é muito mais assistido do que brincado).
A
produção de músicas de carnaval cresceu assustadoramente, ao mesmo tempo em que
a qualidade decaía. Em 1930, apareceram cerca de 130 canções carnavalescas; em
1956, mais ou menos quinhentas cantigas; em 1961, setecentas. Para o carnaval
de 1968 surgiram mais de mil composições, número que continuou a crescer nos
outros anos. Jogadores de futebol, animadores de televisão, artistas,
humoristas, vedetes, etc. resolveram arriscar sua musiquinha para cada ano,
tentando compensar com sua fama em outro terreno a falta de inspiração musical.
O crescimento do mercado e o fortalecimento
da indústria cultural brasileira durante os anos 60 também contribuíram para
a adulteração do significado das músicas de carnaval. As canções carnavalescas
aparecem agora sob o signo da imposição, forjada pela televisão, pelo rádio,
pelas vedetes do disco. Passaram a ser medidas muito mais pelo lucro, do que
pela alegria que proporcionam. Recusando-se a celebrar a folia tais canções
prestam homenagem à banalidade e ao mau gosto. Um exemplo de 1967: “ meu pai é
um chato,/ minha mãe é uma chata,/ meu irmão é um chato,/ minha irmã é uma
chata/, eta vida chata.”
Desaparece
cada vez mais a oposição entre o carnaval e a rotina cotidiana. As regras de
ordem, que eram abolidas durante a soberania de Momo, progressivamente vão se
introduzindo no carnaval, hierarquizando-o, comercializando-o e alterando seu
sentido social e cultural.
Carnaval,
desengano; quarta-feira sempre desce o pano – como poeticamente constatou Chico
Buarque em seu Sonho de um Carnaval.
FONTE:
NOVA HISTORIA DA MÚSICA POPULAR
BRASILEIRA
ABRIL
CULTURAL - 1979
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