SAMBA,
MARCHA-RANCHO, BATUCADA: CARNAVAL - VII
O
samba é outro gênero de música popular brasileira que sempre frequentou o
carnaval. Uma de suas variações, o samba-enredo, é a forma adequada para o tipo
de carnaval que praticam as Escolas de Samba. Ele sustenta musicalmente o
desfile e sua letra conta a história que cada escola procura alegorizar.
O
samba tornou-se um parceiro indispensável da sensibilidade carnavalesca. Se
antes ele era alegre, desenvolto, malandro, com o advento da marchinha ele
adquiriu certa coloração romântica, tornou-se mais queixoso, melancólico.
Embora a pulsação lamurienta possa parecer contraditória com a jocosidade do
carnaval, esta é, na realidade, uma das facetas mais interessantes do samba
carnavalesco.
A
rigor, todo sambista, é, em parte, de carnaval. Mas existem aqueles que
exercitaram sua poética no sentido de compor especialmente para a libertinagem
momesca – embora suas composições também se mantivessem durante o resto do ano.
Assim formou-se um grande elenco de sambistas que compunham para o carnaval, a
exemplo do que faziam Sinhô, Caninha e Careca, no início da década de 20.
Com
a fase de ouro da música de carnaval, nos anos 30, o samba carnavalesco também
adquiriu maioridade, registrando momentos antológicos: Na Pavuna, composto por Homero Dornelas e Almirante; Com que roupa? de Noel Rosa, e Se você jurar, de
Ismael Silva e Nilton Bastos ( 1931); Até
Amanhã (1933), composta pelo Poeta da Vila; Agora é Cinzas (34) de Bide e Marçal; Não tenho lágrimas (38) de Max Bulhões e Milton de
Oliveira.
Em
1940, Arlindo Marques Jr e Roberto Roberti, compõem Música Maestro, e Ataulfo Alves e Wilson Batista, Oh! Seu Oscar. Em 1942,
Praça Onze,
de Herivelto Martins e Grande Otelo. Atire
a primeira pedra (
1945), de Ataulfo Alves e Mario Lago, e Coitado
do Edgar, de Benedito Lacerda e Haroldo Lobo. Deus me perdoe ( 1946) de Lauro Maia e Humberto Teixeira; Onde estão os tamborins (1947),
de Pedro Caetano; Não me diga adeus
( 1948), de Paquito, Luiz Soberano e João Correa da Silva; e É com que esse que e vou, de Pedro
Caetano.
Que samba bom!
(1949) de Geraldo Pereira e Arnaldo Passos.
Na
década de 50 surgem: A Lapa
(1950) de Herivelto Martins e Benedito Lacerta; Lata d’água (1952) de Luiz Antonio e Jota Júnior, e Mundo de Zinco, de Nássara e
Wilson Batista; Zé Marmita (53) de Brasinha e Luiz Antonio, e no mesmo ano Máscara da face, de Armando
Cavalvanti e Klécius Caldas; Madureira
chorou (58) de Carvalhinho e Júlio Monteiro. E na década de 60, Bloco dos sujos (69) de Luis Reis; Tristeza (66) de Niltinho e
Haroldo Lobo.
A
marcha-rancho talvez seja a mais antiga conformação musical dedicada ao
carnaval; alguns estudiosos e críticos chegam mesmo a afirmar que ela é o
gênero carnavalesco mais belo – por seu andamento lento, solicitando a harmonia
dos compassos. A marcha-rancho funciona como elemento de transição entre a
agitação frenética das demais composições que surgiram, uma espécie de
contemplação em meio a gandaia colorida e rítmica do carnaval. Cantada ou
dançada, ela é repousante, sentimental, serena; com ela, um instante lírico se
inscreve no carnaval.
PASTORINHAS
A estrela Dalva,
No céu desponta
E a lua anda tonta
Com tamanho esplendor
E as pastorinhas
Pra consolo da lua
Vão cantando na rua
Lindos versos de amor
De
João de Barro e Noel Rosa, lançada no carnaval de 1938, é um exemplo de como
instantâneos poéticos penetraram a sonoridade carnavalesca.
Outro,
é a clássica MALMEQUER
Eu perguntei a um Malmequer
Se meu bem ainda me quer
Ele então me respondeu que não
Chorei, mas depois eu me lembre,
Que a flor também e uma mulher
Que nunca teve coração
De
Newton Teixeira e Cristóvão de Alencar, cantada pela primeira vez no carnaval
de 1940.
Os rouxinóis
(1958), de Lamartine Babo, Máscara
Negra (1967), de Pereira Matos e Zé Kéti, e Bandeira Branca (1970) de Max Nunes e Laércio Alves, também
se inscrevem nessa tradição.
A batucada
é outra modalidade musical que costuma ser empregada nos festejos
carnavalescos brasileiros. Tudo indica
que a expressão “batucada” - usada para designar uma variante nova,
diferente do samba e da modinha – apareceu pela primeira vez na composição OJU-BURUCU
( 1925), de Sinhô, que possuía marcantes influências africanas. O termo,
contudo, devera ser corriqueiro entre os sambistas, para se referir ao batuque,
não como dança, mas como música; “ batucada” significava não somente o conjunto
de percussão, ou a maneira de execução, mas uma nova forma de se compor.
Na Pavuna,
já fazia, em sua letra, menção à batucada: “ com seu time enfezando o batedor/
e grita a negrada:/ vem para batucada/ que de samba na Pavuna tem doutor.”
No
carnaval de 1932 faz sucesso a batucada Jà
andei, de Pixinguinha, Donga e João da Baiana, consolidando a entrada
do gênero para o repertório da canção carnavalesca brasileira. A cuíca tá roncando (1935) de
Raul Torres; Cai-cai (1940)
composição de Roberto Martins, um dos maiores sucessos dos carnavais de todos
os tempos; Poleiro de pato é no chão(1941) de Rubens Soares; Levanta José (1942) de Dunga e
Haroldo Lobo e Nega do Cabelo Duro(1942)
de Rubens Soares e David Nasser; e finalmente General da Banda(1949) de Sátiro de Melo, José Alcides e
Tancredo Silva, que despontou com grande popularidade no carnaval de 1950 – uma
batucada com os procedimentos dos pontos de macumba, sendo que a melodia já era
executada em alguns lugares do Estado do Rio como saudação a Ogum.
Além
da batucada-canção carnavalesca, a expressão remete também aos grupos de
ritmistas que saem batucando pelas ruas, emprestando animação ao carnaval. Usam
uns poucos e rudes instrumentos de percussão, mas fornecem um ritmo generoso,
aliciador da alegria em meio à batucada da vida.
A
partir de 1969, uma nova tendência começa a aparecer nas músicas de carnaval;
trata-se de uma linguagem que se inaugura como a canção Atrás
do Trio Elétrico, de Caetano Veloso. Aproveitando-se da existência dos
trios elétricos do carnaval baiano, e do ritmo marcante do frevo, Caetano
promove um carnaval jovem, mais adaptado à sensibilidade contemporânea. O
carnaval não poderia ficar impermeável às transformações sociais e
comportamentais da vida brasileira, e o, compositor baiano procurou modernizar
certas tradições rítmico-carnavalescas nordestinas, atingindo um “frevo novo”
do melhor efeito e da maior animação.
Nessa
linha destacam-se suas composições: Deixa
Sangrar; Chuva, suor e Cerveja; Deus e o Diabo; Cara a cara; A filha da
Chiquita Bacana; Piada e outras;
e ainda, Tá na Cara de
Gilberto Gil e Estamos aí de Paulo Diniz, cantada por
Gal Costa.
FONTE:
NOVA HISTORIA DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA
ABRIL
CULTURAL - 1979
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