terça-feira, 1 de setembro de 2015

ADONIRAN BARBOSA - 105 ANOS - TRIBUTO - PARTE I





João Rubinato, filho de imigrantes italianos, que vieram de Veneza para Valinhos, no Estado de São Paulo.  O pseudônimo Adoniran Barbosa, ele passou a usar por volta de 1935. Mas, como toda história, esta também tem seu começo.
Seus pais Francesco Rubinato e Emma Ricchini se casaram em Cavarzere, Veneza, em 1895  e poucos meses depois embarcaram para o Brasil em busca de uma vida melhor, desembarcando em Santos em 15 de setembro de 1895. Eles passaram pela Hospedaria dos Imigrantes e foram para o interior trabalhar nas lavouras.
Em Valinhos:
-E  nóis fumo nascendo, fumo nascendo, fumo nascendo, fumo nascendo, fumo nascendo, fumo nascendo,  e eu também fui nascendo, o sétimo, contou Adoniran. Mais ou menos depois da guerra de Canudos. Depois veio outra guerra, a de 1914, e quando acabô, eu já tinha 8 anos de idade. Bunito”. Adoniran nasceu no dia 6 de agosto de 1910.  E continua:  como naquele tempo não tinha jardim da infância, eu frequentava era as ruas da infância. Dá samba, não?  Durou pouco a brincadeira, pois daí a uns par de meis mudamos pra Jundiaí e lá me enfiaram num grupo escolar. Fiquei lá dentro a muque, só até o terceiro ano. As aulas eram de manhã e de tarde eu ia ajudar meu pai a carregar vagão na Estrada de Ferro São Paulo Railway – depois Santos a Jundiaí: tijolos, telhas, lenha.  Naquele tempo eu já dizia: “Vamo João , tem muita lenha para carregar. Pra você ver que esse negócio  de dizê:” tem muita lenha”, “é uma lenha”, não é coisa tão nova assim.
- Depois saí do grupo, larguei de ajuda meu pai e arranjei um emprego gostoso de entregador de marmita do Hotel Central. Bom entregá marmita. No meio do caminho eu abria as tampas e afanava uns pastéis ou uns bolinhos. Mas antes de fazer isso eu somava e diminuía pra ver se não ia faltar nas casas, pra alguma criança, sobretudo. Aí não afanava não, tinha pena, ficava com dó. Quase sempre eles botavam a mais e eu  podia comer uns par de bolinhos e de pastéis.  Gostoso!  Ah, floreando a coisa pra parecer bonzinho... Ficava com dó nada, eu comia mesmo, desse o que desse a conta. Gosto tanto de pastéis que me apelidaram de Rei da Estufa. Mas daí, deu reclamação e me mandaram embora.
- Depois fui trabalhar numa fábrica de tecidos, mas como varredor. Ainda ouço a turma me chamando: “Ei, Joanim Barredô!”. Trabalhava das 4 horas da tarde às 11 da noite e ganhava 400 réis por hora. Mas veio a revolução de 1924 e fumo morar em Santo André. Lá fiz de tudo. Vai anotando: tecelão, pintor, encanador, serralheiro, etc. e tal. No duro, o que eu precisava era um serviço mais leve, não moleza. Bolei ser mascate, Vendia meias e retalhos nas ruas, por aqueles bairros pobres. Andava o dia inteiro. Ajudava o serviço cantar um pouco. Sem querer, fui fazendo uns sambas, enquanto andava. E peguei esse jeito de compor, andando, até hoje... Mas esses sambas de mascate eram na base do deixa-pra-lá, porque eu achava todos ruins e feios. Já pensou que tem sambas ruins que não são feios e feios que não são ruins? Eu não tinha jeito pra mascate – nunca aprendi a fazer negócio. Comprava um par de meia por 10 mil-réis, vendia por 8, pra acabar logo com a mercadoria e me mandá pra casa. Não dava pé, nem meia, muito menos lucro.
- Tamos agora lá por 1926/1927. Fiquei um tempão desempregado, dureza, dureza. Tavam procurando um empregado doméstico. Um amigo chegou, pegou e me disse: “João, vai naquela casa, tão querendo um garção”. Aí eu falei pro meu amigo: “Magina, seu, eu garção? Num sei nem o que é isso”. Mas fui e comecei a trabaiá no outro dia.
Adoniran conseguiu ficar como garçom. Quem lhe ensinou o trabalho foi a filha do dono da casa onde se empregou. O patrão  era Pandiá Calógeras, ministro da Guerra. Mas o ministro transferiu-se para o Rio de Janeiro  e Adoniran ficou desempregado novamente. Empregado/desempregado/empregado/desempregado: tudo isso estava se tornando cansativo.  Adoniran chegou a conclusão de que o melhor era conhecer um ofício. E foi o que fez, no Liceu de Artes e Ofícios, onde aprendeu a profissão de metalúrgico-ajustador.  Mas o trabalho com esmerilhamento de ferro fundido acabou prejudicando seus pulmões e novamente se viu desempregado.  Outros empregos vieram: loja de ferragens, uma agência da Ford, e loja de tecidos na Rua 25 de Março.
- Aí eu era entregador das compras que as madamas faziam lá. Nessas caminhadas passava sempre na Rádio Cruzeiro do Sul, no Largo da Misericórdia. Fiquei conhecendo o Paraguaçu, Januário de Oliveira e muita gente boa daquele tempo. Era o Zezinho do banjo, o Zé Carioca do filme de Walt Disney, o Gaó, Jorge Amaral, um monte de gente boa.
- Mas eu ainda não tinha entrado no meio artístico. Vivia batucando e cantando e tinha feito algumas músicas. A primeira eu fiz com o Pedrinho Romano, um amigo, e chamava MINHA VIDA SE CONSOME, e TEU ORGULHO ACABOU, esta com Viriato dos Santos. Depois parei de fazer, porque eu trabalhava no comércio e não dava. Mas aos sábados tinha a hora do calouro. Cismei  e todo sábado me arriscava. Era só começá e lá vinha o gongo. Mas eu não desistia. Um sábado, o homem do gongo devia de está distraído e consegui chegar até o fim num samba do Noel –  Filosofia. Jorge Amaral era o anunciador do programa da Rádio Cruzeiros do Sul, PRB-6. Fui aprovado, mas nada de dinheiro.
- Daí me contrataram pra cantar. Quem me convidou foi o Paraguaçu. Fazia um programa semanal de 15 minutos com o regional – Garoto, violão-tenor, Aimoré, violão, Petit, violão, Pingo, no pandeiro, Pinheirinho, no cavaquinho, e Ernesto, na flauta. Eu cantava sambas de outros compositores. Fiquei fazendo esse programa na Rádio Cruzeiro do Sul até 1940 e poucos. Aí eu já fazia programa falado como locutor, animador de programa de discos. Arrumava os anúncios e fazia o meu programa. Era mais ou menos um disc-jockey, e no meio eu cantava um sambinha meu.  Mas eu não saía do Largo da Misericórdia, não largava a turma.  Andava num arrois que dava gosto. Tava sempre na boca do cafezinho dos outros pra tomar o meu, no peito ou de favor de amigo. Na hora das refeições, todos se mandavam e eu ficava sozinho. Pros cafés e pras brancas eles convidava, sempre pros negativos, mas pros positivos, sanduíches, refeição, ninguém. Não tou queixando, ninguém ali tinha de sobra. Um sambista então me ensinou um babado fino: ficar faixa dos funcionários da Prefeitura e depois se mancar na porta onde tinha fila. Por uns mil-réis, quebrava os galhos do pessoal das filas com os meus amigos lá dentro. Ganhei tão bem que até mudei de um quartinho michuruco na Ladeira Porto Geral para uma pensão na Rua Liberdade.
- Agora é 1935. Tinha o concurso da Prefeitura de São Paulo pra música de carnaval. O Jota Aimoré, pianista do Rio de Janeiro, fez uma melodia e me disse: “ Vamos ver se o nosso sangue combina”. Eu botei a letra e concorremos com a marcha DONA BOA. Fiz essa música na Rua Direita. Quando passava uma moça bonita o pessoal olhava e dizia: “Ô dona boa!”. A música começava assim: “Dona boa – Dona Boa, Vem pro cordão, não fique assim à toa...”.
Adoniran acha essa música ruim. Mas ela ganhou o primeiro lugar no concurso. Januário de Oliveira foi quem a defendeu no Teatro Boa Vista.  E, mais tarde, Raul Torres gravou-a na Columbia, atual ( 1978) Continental.  O prêmio foi de 500 mil-réis. Era muito dinheiro para os dois compositores. Com o cheque na mão, saíram à rua, seguidos por um montão de amigos. Adoniran queria guardar o dinheiro, que serviria para pagar um paletó que mandara fazer. Mas aí...
- Eu disse pro meu companheiro : “vamos embora. Amanhã nóis troca o cheque e divide, tá bem assim.?”  Ele disse: “não, que nada. Você conhece todo mundo aqui. Vamos trocar agora mesmo”. Aí entra a curriola: “ É isso mesmo, troca o cheque. Vamos lá no Café Chenique, que eles troca pra voceis”. Eu não queria, pois sabia que, se trocasse, a gaita ia toda aquela noite. Mas não teve jeito. Mora se dava, com a turma em coro: “ troca o cheque e paga alguma coisa pra nóis, a gente batemos palmas pra tua marcha, sem nóis voceis não ganhava”. Aí eu falei: “ bom, mas da minha parte eu não posso gastar nem um tostão, porque mandei fazer um palitó e tenho que ir buscar amanhã”. Pois sim! Ali na Praça da Sé, pela noite toda, bebemos o meu palitó.
- No fim de 1941 fui pra  Rádio Record, levado pelo Otávio Mendes. Trabalhava com ele fazendo novela e rádio-teatro. O programa de rádio-teatro  se chamava Serões Domingueiros. Então eu funcionava como ator. Acabei ficando só na Record, onde fiquei amigo de Oswaldo Molles, Raul Duarte, Teófilo de Almeida Sá. No ano seguinte encontrei o maior sujeito do mundo, o Barreto Machado.  Era rádio-ator e ganhava um conto de réis por mês e só fazia um programa. Eu trabalhava todos os dias e recebia 30 mil réis por programa. Me queixei pro Teófilo  de Almeida Sá, na Record e ele me disse: “ Fala com o Barreto, vê se ele quer dividir  o dele com você”. Fumo os dois falá com o Barreto. Ele nem discutiu: “Vamos dividir sim, é justo, num tem nada, dividido.”  Nessa época eu já estava morando na Rua Aurora.
- O Molles, que fazia o programa Casa da Sogra, criou um tipo pra mim, o malandro Zé Cunversa.  Agradei, e ele inventou outros personagens: Zé Cunversa e Catarina – que eu fazia com a Maria Amélia -, Moisés Rabinovic, judeu das prestações, Jean Runinet, galã do cinema francês, Richard Morris, professor de inglês, Dom Segundo Sombra, cantor de tango-paródia, o Perna Fina, chofer italiano, Comendador Gigio Magnagati etc... Depois a Record contratou o Gilberto Martins e ele produziu o programa Escola Risonha e Franca, e para esse programa ele criou um personagem, o moleque Barbosinha Mal-educado da Silva. Foi um sucesso. O programa era de auditório e começava às 6 horas. Às 3 horas já tinha uma fila enorme na Rua Quintino Bocaiuva. E já naquele tempo as moças tiravam lenço e gravata da gente. Muitas mocinhas levaram meus lenços e minhas gravatas. O Barbosinha era cartaz. Durante o dia levavam o programa Casa da Sogra, onde eu vivia aqueles outros personagens.  Ao fim da tarde era a hora do Barbosinha e à noite eu ainda fazia o programa O Crime não compensa. Meu papel  era sempre o do criminoso. Fazia também os tipos estrangeiros e os crioulos da história do crime.

Em 1936, Adoniran casou-se com Olga Krum, com quem teve sua única filha, Maria Helena Rubinato, nascida em 23 de setembro de 1937. O casal desquitou-se em 1943.  Após o desquite, constituiu nova família com Matilde de Lutiis, que o acompanhou até a morte, mas nunca tiveram filhos.


fonte:  Nova História da Música Popular Brasileira - Abril Cultural - 1978
fotos: google
vídeo: youtube

ADONIRAN BARBOSA - 105 ANOS - TRIBUTO - PARTE II

Os anos foram passando. Apesar de todo o seu trabalho e sucesso no rádio, Adoniran não esquecia o samba. Assim, em 1947, compôs ASA NEGRA, gravada por Hélio Sindô, na Continental. Era um samba mais ou menos na base da dor-de-cotovelo:
“ depois que aquela mulher me deixou/ minha vida melhorou/ se eu soubesse disso,/teria deixado aquela mulher há mais tempo./ Hoje vieram me dizer/ que ela vive a sofrer/ e não sabe o que fazer/ eu sei por quê:/ela era a minha asa negra.
Mas, então as coisas mudaram de rumo novamente.
- Aí o Molles saiu da Record e foi para a Bandeirantes. E eu fui fazer cinema. Trabalhei para a Cinédia, com o Adhemar Gonzaga: Pif-Paf e Caídos do céu, com Dercy Gonçalves.
Em 1952 fiz O Cangaceiro e fumo premiado em Cannes.  A filmagem foi em Vargem Grande. Quando voltei o Molles estava de novo na Record e tinha escrito pra mim a História das Malocas. Eu já tinha gravado o samba em 1950, e ele escreveu em cima da música e criou o personagem Charutinho, não porque eu fumasse charuto, mas porque eu era corintiano, e ainda sou – e na época o Coríntians estava pras cabeça. O presidente do Coríntians fumava charuto e daí o nome. Esse programa era apresentado  sexta-feira à noite e reprisado  no domingo às 11 horas. Foi sucesso total e ficou dez anos no ar. Acabou em 1965.
- Agora começa as ondas dos sambas. Em 1951 fiz MALVINA, gravado pelos Demônios da Garoa:
                                   “Malvina, você não vai me abandoná
                                   Não pode. Sem você como é que eu vou ficá?”
Foi premiada no carnaval desse ano com votação dada pelos jornais.  O concurso foi instituído  pela Organização Rádios Assunção, que ficava na Praça da República.  O prêmio foi de 10 contos.
Aí fiz JOGA A CHAVE  de parceria com Oswaldo França e que também foi gravado pelos Demônios da Garoa. Todo mundo aqui em São Paulo cantou a música:
                                   “joga a chave meu bem, que aqui fora  tá ruim demais.
                                   Cheguei tarde, perturbei o teu sono,
                                   Amanhã eu não perturbo mais”.
- Ah, eu tinha um cachorrinho, o Peteleco. De noite saía pra dar um passeio com ele pela Rua Aurora. O prédio onde funcionou primeiro o Hotel Albion, e depois o cine Áurea, ficou abandonado uma porção de tempo. Uns e outros sem compromisso, que para ganhá pra cachaça e pro sanduíche faziam biscates nas feiras, lavavam carros ou eram engraxates, de noite se escondiam lá dentro, pois não tinham onde dormir. Eu conhecia todos – O Mato Grosso, o Joca, o Corintiano. Eu visitava eles, junto com o Peteleco, naquela moradia. A gente batia papo, se entendia e se queria bem. No dia que começo a demolição do casarão, cheguei lá e num vi mais nenhum dos meus amigos. Sumiram, fiquei triste e tive a ideia de fazer um samba pra eles.  Tava na rua andando, do Viaduto do Chá para a Quintino Bocaiúva, e o samba foi saindo , letra e música tudo junto.
                                   “ Saudosa maloca, maloca querida,
                                   Din-din-donde nóis passemo
                                   Os dias feliz da nossa vida.”




                                                 Saudosa Maloca - Demônios da Garoa
SAUDOSA MALOCA fez enorme sucesso. A música rendeu na época 90 000 cruzeiros ao compositor. Depois vieram: AS MARIPOSA, SAMBA DO ARNESTO,PROGRÉSSIO, ABRIGO DE VAGABUNDOS, IRACEMA.  Todas gravadas pelos Demônios da Garoa.
Samba do Arnesto, baseada num fato verídico, teve problemas para ser gravada. Adoniran explica:
- O Samba do Arnesto eles não queriam gravar porque falava um português errado: “ nóis vai, nós vorta”. Mas é bobagem, porque todo mundo fala assim, e fui eu quem criou estas expressões:  “morrer de rir”, “sai água da minha boca”, “ aqui, Gerarda”, “depois que nóis vai, depois que nóis vorta”, etc . E pegou mesmo.
Fiz o Samba do Arnesto em 1955. A primeira gravação fui eu que fiz. Um dia saí da Record e fui à procura do Joca e do Mato Grosso. Eles tinham me convidado para um samba na casa de um amigo do Joca que morava no Brás.  O amigo do Joca se chamava Ernesto, mas a turma chamava ele de Arnesto. Apanhamos o bonde na Praça Clóvis e rumamos para o Brás. Descemos na Rua Bresser e caminhamos até a terceira travessa, onde morava o Arnesto. Era um cortiço, e quando chegamos lá, ficamos sabendo que o Arnesto não tinha recebido o dinheiro que esperava para fazer o baile. Envergonhado, fechou a maloca e se mandô pra Penha. Decepcionados, voltamos para a cidade e dentro do bonde veio a vontade de fazer esse samba. Mato Grosso que era mais valente, prometeu dar uma surra no Arnesto pela falta de consideração. Mas depois ficou sabendo o motivo da fuga e resolveu esquecer o incidente.
Depois que o progama  História das Malocas saiu do ar, Adoniram ficou meio parado. E a morte de Oswaldo Molles deixou um branco em sua carreira humorística.  Em 1965 foi gravada a música TREM DAS ONZE, que ganhou o primeiro prêmio de músicas de carnaval do Rio quatrocentão.  Depois, Adoniram compôs MULHER, PATRÃO E CACHAÇA,  e VILA ESPERANÇA.  Esta última, de parceria com Marcos César, ganhou o segundo lugar num concurso da TV Tupi, rendendo ao compositor 5 000 cruzeiros. Fora isso ele participou de alguns programas humorísticos. Com Renato Corte Real  fez o Papai Sabe Nada, e trabalhou também na novela  Ceará contra 007.  História das Malocas que fizera sucesso no rádio, foi levado para a televisão, mas só resistiu três programas.  Depois disso, Adoniran não fez mais nada em televisão, esteve meio relegado ao esquecimento. Isso, em termos de televisão.
- Um dia, conta Adoniran, eu estava com a Aracy de Almeida, no auditório da Rádio Record, e ela me mostrou uma carta que tinha recebido do Vinicius de Moraes, que estava em Paris, trabalhando na Embaixada. Dentro vinha dois versinhos. Embaixo, dizia: “Aracy, faça o que quiser com estes versos”.  Ela feis:  deu prá mim botá música. O nome do poema era Bom Dia, Tristeza. Eu botei, sabe? Assim é que, sem nos conhecermos, eu e o Vinicius fomos parceiros. Quem gravou a música foi a  Aracy e depois o Mauricy Moura.

                                               Bom dia, tristeza,
                                               Que tarde, tristeza
                                               Você veio hoje me ver
                                               Já estava ficando
                                               Até meio triste
                                               De estar tanto tempo
                                               Longe de você

                                               Se chegue, tristeza,
                                               Se sente comigo
                                               Aqui,
                                               Nesta mesa de bar
                                               Beba do meu copo
                                               Me dê o seu ombro
                                               Que é para eu chorar
                                               Chorar de tristeza
                                               Tristeza de amar


                                              Bom Dia Tristeza - Araci de Almeida

Tudo isso Adoniran contou tranquilo em sua casa na Cidade Ademar (década de 70). O terreno ele comprou com o dinheiro que ganhou com Saudosa Maloca, e a casa foi construída com o dinheiro do Trem das Onze.
Mas de tanto calo que a vida lhe dera, Adoniran achou que Trem das Onze era seu canto de cisne, que tudo ia ficar bem por um tempinho e que depois viria o fatal esquecimento. Só que dessa vez não foi bem assim; os mais moços gostaram de seu trabalho e ele começou a ter trânsito em novas áreas. Com seu jeito simpático de paulistano velho, ele ia se apresentando para gente que pouco ouvira falar daquelas coisas de antigos bairros e seus personagens.
Em pouco tempo o homem que sabia ver a poesia da multidão de São Paulo ficou famoso e admirado, com músicas apreciadas pelas novas gerações e analisadas por intelectuais. Em 1973, Adoniran lançava o primeiro LP, cantando composições suas. Dois anos depois, sairia outro LP, na mesma época em que se inaugurava o metrô da cidade, citado no samba TRISTE MARGARIDA (para conquistar uma mulher, ele mentiu que era engenheiro do metrô de São Paulo, prometendo que ela seria a primeira passageira na inauguração.  Mas o caso de amor terminou quando, passando de ônibus pela 23 de Maio, sua amada o viu plantando grama no barranco da avenida; por outro lado ele descobriu que ela, “orgulhosa e convencida”,  “ não passa de uma triste margarida” – apelido dado às varredoras de rua.
Em 1978,  como homenagem à nova Praça da Sé, e em comemoração aos seus 40 anos de carreira artística, Adoniran fez MADAME PRAÇA DA SÉ.
Como disse Raul Duarte: “o homem que ganhou a vida escondido sobe mil pseudônimos vê o Brasil querendo conhecer o verdadeiro Adoniran Barbosa, que também é um pseudônimo”.  “ Talvez João Rubinato não exista, porque quem existe é o mágico Adoniran Barbosa, vindo dos carreadores de café para inventar no plano da arte a permanência de sua cidade e depois fugir, com ela e conosco, para a terra da poesia, ao apito fantasmal do trenzinho perdido da Cantareira.” ( Extraído de um texto do Professor Antônio Candido, apresentando o segundo LP de Adoniran).
Adoniran Barbosa morreu aos 72 anos de idade, no dia 23 de novembro de 1982.
Deixou um acervo de 108 músicas.




RELAÇÃO DAS MÚSICAS DE ADONIRAN BARBOSA


MÚSICAS DE ADONIRAN BARBOSA
Parte superior do formulário

Parte inferior do formulário
·         A Louca Chegou
·         A Luz Da Light
·         Abrigo de Vagabundos
·         Acende o Candieiro
·         Adeus, Escola
·         Agora Podes Chorar
·         Agora Vai
·         Agüenta a Mão, João
·         Apaga o Fogo Mané
·         Aqui Geralda
·         Armistício
·         Arranjei outro Lugar
·         As Mariposa
·         Asa Negra
·         Bazares
·         Bom Dia Tristeza
·         Carolina
·         Chega
·         Chora Na Rampa
·         Chorei, Chorei.
·         Chum Chim Chum
·         Conselho de Mulher
·         Currupaco (gente curiosa)
·         Despejo na Favela
·         Deus Te Abençoe
·         Ditado
·         Domingo
·         Dona Boa
·         Dondoca
·         É da Banda de Lá
·         Envelhecer é uma Arte
·         Eternidade
·         Eu Quero Ver Quem Pode Mais
·         Eu Vou Pro Samba
·         Existência
·         Fica Mais Um Pouco Amor
·         Filé De Onça
·         Filosofia
·         Gulú, Gulú
·         Iracema
·         Já Fui Uma Brasa
·         Já Tenho a Solução
·         Jabá Sintético
·         Joga A Chave
·         Lagartixa
·         Leiteratura
·         Letra de Samba
·         Mãe eu juro!
·         Malvina
·         Minha Nega
·         Minha Vida Se Consome
·         Mulher, Patrão e Cachaça
·         Não Me Deu Satisfação
·         Não Quero Entrar
·         No Morro da Casa Verde
·         No Morro do Piolho
·         Nóis Não Usa Os Bleque Tais
·         Nóis Viemos Aqui Pra Quê?
·         O Caminhão Do Simão
·         O Casamento do Moacir
·         O Legume Que Ele Quer
·         Ói Nóis Aqui Traveis
·         Olha a Polícia
·         Olhos De Sono
·         Pafúnça
·         Pincharam A Estação No Chão
·         Plac-ti-plac
·         Pra Que Chorar
·         Praça da SÉ
·         Prova de Carinho
·         Provérbios
·         Quando Te Achei
·         Quem Bate Sou Eu
·         Roubaram a Lagosta
·         Rua Dos Gusmões
·         Samba do Arnesto
·         Samba Italiano
·         Samba Quente
·         Saudosa Maloca
·         Senta, Senta
·         Só Tenho a Ti
·         Tadinho do Home
·         Tangolomango
·         Teu Orgulho Acabou
·         Tiro Ao Álvaro
·         Tô Com A Cara Torta
·         Tocar Na Banda
·         Torresmo À Milanesa
·         Trem das Onze
·         Um Amor Que já Passou
·         Um Samba No Bexiga
·         Vai da Valsa
·         Velho Rancho
·         Véspera de Natal
·         Viaduto Santa Efigênia
·         Vide Verso Meu Endereço
·         Vila Esperança
·         Voar
·         ZÉ Baixinho


fonte:Nova História da Música Popular Brasileira -( Abril Cultural) - 1978
foto: Google
vídeo: Araci de Almeida - Bom dia Tristeza - youtube
vídeo:Saudosa Maloca - Demônios da Garoa- youtube
letras.mus.- google