quinta-feira, 2 de março de 2017

PIXINGUINHA E "CARINHOSO"

  

Em 1923, Pixinguinha compôs “ CARINHOSO” que ficou escondida durante 14 anos, pois o autor considerava uma composição “jazzificada”. Pixinguinha tocava a música no dancing Eldorado, no Rio de Janeiro, quando Orlando Silva ouviu a melodia e pediu para gravá-la.  Ao ser informado que não havia letra, Orlando Silva levou João de Barro ao dancing, e quatro dias depois a letra estava pronta. Orlando Silva, no auge de sua carreira, gravava  uma página definitiva da música popular brasileira.






Carinhoso

(Pixinguinha e João de Barro)



Meu coração

Não sei porque

Bate feliz
quando te vê.



E os meus olhos ficam sorrindo

e pelas ruas, vão te seguindo

mas mesmo assim
foges de mim



Ah! se tu soubesses

como eu sou tão carinhoso 

e o muito muito que te quero


e como é sincero meu amor

eu sei que tu não fugiria

mais de mim


vem, vem,vem, vem

vem sentir o calor

dos lábios meus
a procura dos teus



vem matar esta paixão

que me devora o coração

e só assim então,
serei feliz,
bem feliz.



Meu coração ......



 Alfredo da Rocha Vianna Junior, mas conhecido como PIXINGUINHA, nasceu na Piedade, a 23 de abril de 1898, dia de São Jorge, dia de Ogum. Aluno do colégio mantido pelo Mosteiro de São Bento, por onde mais tarde passariam, entre outros,  Heitor Villa-Lobos, Noel Rosa e Lamartine Babo, não criou problemas com a rígida disciplina da escola, mas nunca foi aluno brilhante, pois estudava só para agradar os pais.
O pai, Alfredo da Rocha Vianna, funcionário do Departamento Geral  dos Telégrafos, era também flautista respeitado, e Pixinguinha sentia-se atraído pelas serenatas que seu pai promovia em casa. Ficava quieto escutando,  fascinado, polcas, valsas e lundus da moda.
A avó, Dona. Edwiges, africana de nascimento, em seu dialeto natal o chamava de Pizindin (“menino bom”), e a molecada da vizinhança preferia o apelido de “Bexiguinha”, referência às marcas que a varíola deixara no rosto do menino. “Pizindin” e “Bexiguinha” com o tempo se misturaram, originando o “PIXINGUINHA”, definitivamente consagrado em 1956, quando passou a designar uma rua do  subúrbio carioca de Ramos, onde o músico morou durante 29 anos.
Pixinguinha cresceu tocando na flauta de folha imitações daquilo que ouvia na serenata  dos grandes. Apurando o ouvido, o dedilhado e a criatividade, quando não conseguia reproduzir um som inventava outro que também soasse bonito. Aos doze anos estava tão familiarizado  com a música que logo esgotou os conhecimentos de teoria musical  de César Borges Leitão (vizinho de rua e colega de trabalho do velho Vianna), que se limitava às lições de um antigo método de Francisco Manuel da Silva.


Nessa época, Pixinguinha já tocava razoavelmente cavaquinho e bombardino, mas sonhava com a requinta, espécie de clarineta de sons agudos.
O pai ensinou-o a tocar flauta, instrumento que mais tarde Pixinguinha dominaria como mestre. As primeiras lições de flauta coincidiram com a mudança da família para um casarão de oito quartos e quatro salas, na Rua Vista Alegre, logo apelidado de “Pensão Vianna”, pois estava sempre cheio de gente, na maioria músicos convidados pelo velho Vianna. Um dos frequentadores mais assíduos era o Professor Irineu de Almeida, que logo se entusiasmou com os progressos de Pixinguinha na flauta, levando-o  em 1911 para o grupo carnavalesco FILHAS DA JARDINEIRA.  O novato estreou em grande estilo, participando de uma batalha de confetes na Avenida Central  (hoje Rio Branco). No mesmo ano compôs sua primeira música LATA DE LEITE, dedicada aos companheiros de estripulias, que costumavam roubar o leite da porta das casas.  No ano seguinte voltou ao carnaval como diretor de harmonia do RANCHO PALADINOS JAPONESES.
Irineu de Almeida fixou residência na “Pensão Vianna”, orientando de perto os progressos do flautista.  Animadíssimo com o talento do filho, o velho Vianna importou da Itália uma flauta especial que custou muito caro. Surgia mais um músico na família Vianna. Levado pelo irmão China, que tocava violão, Pixinguinha, com apenas catorze anos, foi contratado para o conjunto da CONCHA, casa de chope da Lapa.
O flautista de calças curtas, conhecido em quermesses e festas familiares, logo ganhou fama na vida noturna carioca.  Com uma proposta melhor, ele foi tocar no PONTO, no ABC, no CASSINO. Tocava até de madrugada, entusiasmando todos com o seu sopro e imaginação. Nem por isso abandonava os hábitos de soltar pipas e fumar escondido, os cigarros fortes da época.
E lá estava o rapazinho empinando um papagaio quando apareceu um cidadão que lhe trazia um convite do violonista Arthur Nascimento (Tute) para tocar com a orquestra, no TEATRO RIO BRANCO. No dia seguinte, o primeiro ensaio: os bigodudos músicos preocupados com as páginas da partitura e Pixinguinha tranquilo, soprando limpo e bonito a música inteira, em perfeito entendimento com o resto da orquestra. E assim – sem sequer olhar para a partitura – Pixinguinha garantiu seu lugar na orquestra que tocaria na peça  "Chegou Neves", com o melhor elenco da época.
Pixinguinha fazia progressos: recebia convites para tocar em festas, teatros, clubes e já usava calças compridas. Em 1915 fazia sua primeira gravação para a Casa Falhauber: com o Choro Carioca, interpretou o tango brasileiro SÃO JOÃO DEBAIXO D’ÁGUA,de seu professor e amigo Irineu de Almeida.
Em 1917 gravou para a Casa Edison, com o Choro Carioca, músicas de sua autoria: ROSA e SOFRES PORQUE QUERES. Por esse tempo, sua principal atividade era tocar no cinema PALAIS. No carnaval, seu bloco chamado CAXANGÁ, composto de umas quinze pessoas entre os quais João Pernambuco, Lulu Cavaquinho, João da Baiana, vestindo roupas típicas, chapéu branco e cantando canções nordestinas, fazia muito sucesso. O nome do bloco vinha da cantiga CABLOCA DE CAXANGÁ, de João Pernambuco e Catulo da Paixão Cearense.
A epidemia de gripe espanhola, no final da guerra, deixou os filmes mudos sem espectadores, e o cinema não andava bem.  Os empresários precisavam de atrações especiais para recuperar a freguesia. O cinema Odeon contratou o pianista Ernesto Nazareth para tocar na sala de espera.  O gerente do Palais, Isaac Frankel, que ficava quase em frente, chamou o grupo Caxangá, mas era muita gente. Chamou então Pixinguinha e pediu que organizasse uma pequena orquestra. O flautista não acreditou: negros tocando na luxuosa sala de espera do cinema Palais? Pixinguinha escolheu sete companheiros: JOSÉ ALVES (bandolim), RUAL PALMIERI (violão), NÉLSON DOS SANTOS (cavaquinho), JACÓ PALMIERI (pandeiro), DONGA (violão) LUÍS DE OLIVEIRA ( bandolim e reco-reco) e OTÁVIO VIANNA, o irmão CHINA (piano, violão e canto), os OITO BATUTAS,  que estrearam no saguão do Palais, no dia 7 de abril de 1919, como orquestra típica de maxixes, lundus, corta-jacas, batuques, cateretês, toadas sertanejas e tanguinhos.
A novidade daquela música intensa e animada fez vibrar o público e o Conselheiro Rui Barbosa, tornou-se  frequentador assíduo  da sala de espera do Palais, pedindo sempre que os Batutas tocassem BEM-TE-VI  de Catulo da Paixão Cearense. O próprio Ernesto Nazareth quando terminava sua apresentação no Odeon, vinha assistir ao espetáculo.
O êxito dos Batutas abriu possibilidades novas para os músicos populares e atraiu o interesse dos ouvintes cultos e refinados para os instrumentos afro-brasileiros que até então só eram conhecidos nos morros e terreiros de macumba.  Com apenas 21 anos, Pixinguinha ampliava os horizontes de nossa música numa época em que gravar não era muito acessível ao artista brasileiro.


Do Brasil para o mundo, Orlando Silva canta a sua gravação original de "Carinhoso" de Pixinguinha, realizada em 1937 no Rio de Janeiro e encanta.  
Fonte: NOVA HISTÓRIA DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA -1976
Fotos: Google
Vídeos: Youtube


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