O PRIMEIRO CONCURSO
Já
no início da década de 30, as escolas de samba se apresentavam na cidade. Os
grupos não ultrapassavam trinta pessoas, segundo Tia Sinhá, do Estácio. Nesse
período, os ranchos eram o grande acontecimento popular do Rio e se
apresentavam na Avenida Rio Branco.
-
Não havia ordem – diz Tia Sinhá. –
Quem chegasse primeiro na Praça Onze entrava. Por isso, havia até muita
confusão e briga. Aparecia, então, muita navalha e sabre, na mão dos homens.
Nós, as mulheres, e as crianças íamos nos abrigar na Igreja de Santana. Não sei
quem arranjava, mas havia sempre uma portinha aberta, junto à sacristia.
Coube
ainda ao macumbeiro Zé Espinguela organizar o primeiro concurso entre os blocos de
samba. – Ele arranjou com um turco, que tinha uma lojinha na Praça Onze, pra colocar lá na
vitrine três tacinhas – relata Cartola.
– E convidou os principais redutos de samba a disputar as taças. No dia da
apresentação, construiu um pequeno palanque e, com amigos, assistiu às
exibições. No final, com todos os representantes em torno, anunciou o
resultado:
1º LUGAR –
MANGUEIRA
2º LUGAR – ESTÁCIO
3º LUGAR - FAVELA
Quando
o pessoal do Estácio foi receber a taça que lhe cabia, aproveitou e a quebrou
na cabeça do Zé Espinguela. É que ele tinha uma amante em Mangueira e o pessoal
do Estácio achou que havia ocorrido proteção.
Segundo
a pesquisadora Marília Trindade Barbosa,
o verdadeiro nome de Espinguela era José
Gomes da Costa, e o primeiro enfrentamento de escolas de samba teria
ocorrido em 1929. O próprio chefe de terreiro e candomblé, em 1º de Março de 1935,
contou ao jornal “A Nação” como tudo aconteceu: “ Eu fui o primeiro organizador
de concurso entre as escolas. Foi em 1929. Realizei no Engenho de Dentro. Sagrou-se campeã a Portela, sabiamente dirigida por Paulo. Mangueira também apresentou-se
pujante, tendo os seus sambistas Cartola e Arthurzinho apresentado dois sambas monumentais: Beijos e Eu Quero Nota.
O
samba vencedor, Não Adianta Chorar,
de Heitor dos Prazeres, fez
jus a uma taça, que seria entregue ao conjunto Oswaldo Cruz
(como
então se chamava a Portela) no domingo de carnaval,
nas escadarias da Escola Benjamin Constant, na Praça Onze. Mas os sambistas do
Estácio e da Mangueira espalharam um boato: iam transformar a festa em briga
feia. Zé Espinguela – embora insistindo no título da campeã – ofereceu
uma taça a cada concorrente, com fitinhas coloridas a distingui-las: azul e branca à futura Portela, vermelha
e branca ao Estácio e verde e Rosa à Mangueira.
Essas
manifestações de belicosidade nos primeiros confrontos explicam a má fama de
que os redutos de samba gozavam, naquela época. Quando o bloco Vai Como Pode, do
bairro de Oswaldo Cruz, pretendeu legalizar-se na Delegacia de Costumes
e Diversões, encontrou a oposição do
Delegado Dulcídio Gonçalves, que não gostou de sua denominação. Após
inúmeras indicações, adotou-se o nome de Grêmio
Recreativo Escola de Samba Portela, que o policial registrou.( A
agremiação tinha sua sede na Estrada da Portela).
Melhor
sorte que a de Zé Espinguela tiveram Orestes Barbosa, R. Magalhães Júnior,
Fernando Costa, J. Reis, José Lira, Álvaro e Eugênia Moreira, reunidos pelo
“Mundo
Sportivo” para julgar um campeonato de samba – que esse jornal de
grande popularidade chamou de acontecimento inédito, num artigo
que publicou na edição de 4 de fevereiro de 1932.
O
desfile se realizaria no dia 9 daquele mês e ano (domingo de carnaval) , em
frente à Escola Benjamin Constant. Ainda não havia samba-enredo, e Décio Antônio Carlos, o conhecido Mano
Décio da Viola, explica como se definia o que cantar na hora da
apresentação: - vinha-se cantando pelas ruas vários sambas, um, dois, três, os
que mais agradavam. Às vezes já se levava tudo combinado, ou, então, o
presidente parava a escola antes do local da apresentação e dizia: “atenção, atenção! O nosso samba oficial
é o de fulano”. Estava escolhida a música de apresentação.
“sorrindo,sorrindo sempre,/ porque
eternamente hei de sorrir/ Para não chorar./ mas, ao me lembrar/ de quem
sofreu,/ padeceu por mim,/para não me ver chorar,/para não me ver chorar” – com
esses versos, do samba SORRINDO, de Zé Com Fome ( mais tarde Zé da Zilda), a ESTAÇÃO PRIMEIRA DE MANGUEIRA iria se fazer campeã desse desfile de escolas de samba, que
o “Mundo Sportivo” chamou de “campeonato do samba”.
Em
segundo lugar colocaram-se a Linha
do Estácio e a Vai como Pode; em terceiro, Para
o Ano sai Melhor; e, em quarto,
a Unidos da Tijuca.
Os
resultados devem ter sido positivos porque no ano seguinte o jornal O GLOBO assumia a promoção do encontro
dos grupos de samba, igualmente na Praça Onze e no domingo de carnaval. Nessa
oportunidade, o concurso ganhava regulamento, tornando obrigatória a presença
de ala de baianas e proibindo instrumentos de sopro. Criaram-se, também, os
quesitos para orientação dos jurados, assegurando-se 5 pontos para poesia do samba; 3 para enredo; 2 para originalidade; e 3 para conjunto.
A Estação Primeira de
Mangueira, com o tema Uma Segunda-Feira no Bonfim,
somaria o maior número de pontos e se tornaria, portanto, bicampeã. A
Azul e Branco ( Salgueiro), ficaria com a segunda colocação; a
Unidos do Salgueiro conquistaria o terceiro lugar; e, por fim,
empatadas no quarto lugar, ficariam Vai Como Pode e De Mim Ninguém se Lembra
( Estácio).
FONTE:
NOVA HISTÓRIA DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA
ABRIL
CULTURAL – 1979
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