sexta-feira, 4 de maio de 2018

CHIQUINHA GONZAGA -FRANCISCA EDWIGES NEVES GONZAGA - 17/10/1847





No dia 17 de outubro de 1847 nascia na aristocrática Rua do Príncipe, no Rio de Janeiro, uma menina que se chamaria Francisca Edwiges Neves Gonzaga, filha de um militar José Basileu Neves Gonzaga e de Rosa Maria Neves de Lima, uma mulata de origem humilde. José Basileu pertencia a uma família ilustre do Império, ligada aos Lima e Silva (que tinha em Caxias o seu maior representante),  e que chegaria  ao posto de marechal de campo.
Se há alguém  de quem se possa dizer (sem perigo de lugar-comum)  que a sua vida parece um romance, esse alguém é a compositora Chiquinha Gonzaga. Quem a visse com seus vestidos escuros, nos últimos anos de vida, na década de 30, comparecendo às estreias teatrais no Rio de Janeiro ao lado de  João Gonzaga, jamais poderia imaginar que aquela austera velhinha de gola alta tivesse sido uma pioneira da emancipação da mulher no Brasil.
À entrada do Teatro São José ou nos jardins do teatro Recreio, os senhores que a cumprimentavam, tirando respeitosamente o chapéu de palha, não podiam, porém, deixar de sorrir amigavelmente ante certas lembranças. Francisca Edwiges, a independente representante da severa família Neves Gonzaga, fora a primeira moça de família carioca a usar um lenço na cabeça, em público, em lugar de chapéu. E na noite de estreia de uma companhia lírica estrangeira, estando sem dinheiro  para comprar uma cadeira na plateia, subiu simplesmente  até os últimos bancos das torrinhas, só frequentadas até então  por estudantes piadistas e irreverentes e pela estranha fauna humana dos profissionais da claque.
Chiquinha Gonzaga, é claro, sabia que atitudes como essa causavam escândalo entre as arfantes senhoras amarradas em espartilhos, que suspiravam com os sonetos de Olavo Bilac, mas era talvez  por isso mesmo que ousava.  A sua independência, lhe tinha custado, quase menina, uma dura guerra, que fora obrigada a sustentar sozinha contra a família e contra os preconceitos.
Quando Francisca Gonzaga nasceu, naqueles primeiros anos do reinado do austero Dom Pedro II, as meninas burguesas que usavam grandes laços de fita e polainas cheias de botõezinhos, não tinham muito em que pensar. Brincavam de roda, aprendiam a ler e escrever, iniciando-se em francês com professores que vinham em casa (o de Chiquinha fora o Cônego Trindade, amigo da família). E, quando chegava a puberdade, eram apresentadas na sala de visitas ao senhor de bigode e costeletas que a família escolhera para ser o seu marido. Com a menina Francisca Edwiges, desde cedo chamada de Chiquinha, o velho costume patriarcal das grandes famílias brasileiras ia cumprir-se com a precisão de um ritual.
Ao completar treze anos, a aluna de piano do Maestro Lobo (e que dois anos antes estreara como compositora com uma cantiga de Natal intitulada CANÇÃO DOS PASTORES, 




veio saber que o seu escolhido era um oficial da marinha mercante chamado Jacinto Ribeiro do Amaral, meio associado ao Barão de Mauá na exploração de um certo navio São Paulo. Corria o ano de 1860  e o então Major Gonzaga previa pelas agitações políticas  na região do rio da Prata,  que um armador não seria mau genro àquela altura.


Jacinto Ribeiro do Amaral

Realizado o casamento, verificou-se que ele tinha razão. Em 1864 começou a guerra do Paraguai e grandes verbas do governo passaram a correr para os bolsos de Jacinto  e do Barão de Mauá, em pagamento do transporte de soldados e material bélico para o sul.

O que era, entretanto, uma satisfação para o previdente chefe da família Gonzaga, tornou-se desde logo o tormento da jovem senhora Gonzaga do Amaral. Com o dobro da sua idade, Jacinto tinha a sólida incultura de um pequeno empresário do Segundo Império, herdeiro de todos os vícios da tradição patriarcal-escravista. Além de implicar com o piano da esposa (que acabou vendendo), Jacinto obrigava-a a viajar com ele, praticamente reclusa em seu camarote do São Paulo. E quando Chiquinha resolveu compensar-se da falta de música comprando um violão, as brigas do casal atingiram o auge. Já a esta altura mãe de três  filhos, a futura maestrina, colocada pelo próprio Jacinto na opção de escolher entre ele e o violão, tomou a sua primeira grande decisão: comprou passagem para ela e para os filhos em outro navio e voltou ao Rio de Janeiro, trazendo o violão.  O marido, no entanto, não permitiu que ela cuidasse dos filhos mais novos, Maria do Patrocínio e Hilário, e apenas o filho João Gualberto ficou com ela.

Fonte: Nova História da Música Popular brasileira
           Abril cultural - edição 1977
Imagens: Google

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